A Biblioteca de Raqueldireitos autorais – A Biblioteca de Raquel http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br Raquel Cozer Mon, 18 Nov 2013 13:27:27 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Uma Feira de Frankfurt atípica, especialmente para brasileiros http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/10/15/uma-feira-de-frankfurt-atipica-especialmente-para-brasileiros/ http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/10/15/uma-feira-de-frankfurt-atipica-especialmente-para-brasileiros/#comments Mon, 15 Oct 2012 11:18:41 +0000 http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/?p=3167 Continue lendo →]]>

O pavilhão da Nova Zelândia, que levou o slogan “Enquanto você dormia” para a feira. De cair o queixo (e também de cair os visitantes às vezes, porque era meio escuro demais)

Foi uma Feira de Frankfurt atípica a que terminou ontem aqui na Alemanha, segundo todos os editores com quem conversei. Como foi minha primeira vez no evento, o maior do mercado editorial no mundo, eu não saberia dizer.

Para mim, o que chamou a atenção foi o mundo que aquilo é. A comparação característica de cursos de jornalismo informa que o espaço onde ficam os oito pavilhões temáticos corresponde a 14 campos de futebol. Agora imagine 14 campos de futebol dispostos num labirinto, no qual se você sai do lado errado terá de atravessar todo o campo de volta até chegar àquele que o interessa, ou a outro errado. Meu senso de direção não ajudou muito.

O atípico, segundo editores, foi o fato de ter estado bem mais vazio que de costume antes do fim de semana, quando a feira é aberta ao público geral –nos outros dias, fica aberto só a profissionais do mercado. Já vinha esvaziando ao longo dos anos, mas desta vez, disseram eles, chamou mais a atenção. Eles creditam isso à crise prolongada na Europa e ao fato de as editoras terem sido compradas umas pelas outras na década passada.

Na sexta à tarde, já estava com certa cara de fim de festa. Editores pagam multa se desmontam os estandes antes do fim da feira, mas vários preferiram isso ou simplesmente abandonar os livros a ter de ficar lá nos últimos dias, quando os negócios entre editores são mais fracos.

O estande do Brasil serviu de ponto de encontro entre agentes e editores brasileiros e estrangeiros (foto de divulgação da FBN)

Foi atípica também a postura de uma parcela dos editores brasileiros participantes. Presentes à feira em outros anos apenas em busca de grandes sucessos estrangeiros, neste ano editores também queriam vender o seu peixe.

É preciso esclarecer, para que ninguém fique com a impressão de que o mundo está deslumbrado com a produção brasileira: apenas uma minoria das editoras presentes à feira conseguiu realizar boas vendas, embora na média tenha sido um ano bom para brasileiros, considerados os padrões. Editoras como Record, Companhia das Letras e Callis vieram a Frankfurt neste ano com foco nas vendas (as duas primeiras também se empenharam nas compras), enquanto outras grandes, como Globo, Sextante, Intrínseca, seguiram o tradicional modus operandi de apenas adquirir candidatos a best-sellers.

Também entra nessa conta o fato de a literatura produzida no Brasil ser pouco comercial, que é justamente o centro de tudo em Frankfurt. O total de direitos vendidos por todas as editoras brasileiras não chega a um décimo do valor pelo qual a Random House comprou um único título americano, “Not That Kind of Girl”, de Lena Dunham, atriz e roteirista da série “Girls”. Este foi comprado por US$ 3,5 milhões, enquanto pelos cálculos iniciais (23% dos formulários respondidos) as vendas das editoras brasileiras no intervalo de um ano, considerando as conversas iniciadas em Frankfurt, devem ficar em torno de US$ 200 mil.

De todo modo, autores como Daniel Galera, Michel Laub, Carola Saavedra e Alberto Mussa conseguiram inclusive ultrapassar a difícil barreira do mercado de língua inglesa, pouco afeito a títulos traduzidos.

A literatura feita no Brasil ainda não é um hit, mas com certeza anda mais cotada que nos últimos 30 anos. A Granta com brasileiros, o programa de traduções de brasileiros no exterior, oferecido pela Biblioteca Nacional a editoras estrangeiras, e o fato de o Brasil ter sido o “país que acontece” em termos econômicos nos últimos anos decerto têm influência nisso.

PS: para quem não acompanhou, escrevi sobre a feira na “Ilustrada” ao longo da semana: a participação do Brasil, a inusitada presença de Schwarzenegger, o desprezo de editores sobre Mo Yan antes do anúncio do Nobel, a iniciativa de três editoras infantis brasileiras de figurar entre as maiores do mundo no pavilhão de língua inglesa e o balanço final. A coluna Painel das Letras, no post abaixo, também foi quase toda dedicada à feira.

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O mercado editorial a caminho de Frankfurt http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/10/08/rumo-afrankfurt/ http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/10/08/rumo-afrankfurt/#comments Mon, 08 Oct 2012 15:53:06 +0000 http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/?p=3143 Continue lendo →]]>

Pavilhão da Nova Zelândia, país homenageado deste ano, na Feira de Frankfurt

Peço desculpas: andei sumida nesta véspera da Feira do Livro de Frankfurt, a maior do gênero no mundo, sobre a qual escrevi no sábado na “Ilustrada”. No mercado editorial, tudo gira em torno do evento nestes dias, minha rotina incluída. 

Fala-se muito neste ano sobre a preparação para a participação brasileira, no ano que vem. É importante para o Brasil, não há dúvida: para ficar num exemplo, o programa de apoio a traduções de títulos brasileiros no exterior, da Fundação Biblioteca Nacional, concedeu 141 bolsas no último ano e meio, ante 178 concedidas em uma década inteira, de 1991 a 2010. 

E aí você pode perguntar “e eu com isso?”, mas é inegável a relevância dessas traduções no exterior para o Brasil –talvez menos comercialmente do que culturalmente, como forma de apresentar o país ao mundo, mas o fator comercial entra, sim: em última instância, traduções podem influenciar no turismo (sabendo nós que o número de estrangeiros dispostos a conhecer o Brasil nunca foi palpitante perto do que esse mundão de território tem a oferecer).   

Veremos se as bolsas de tradução continuarão atraindo interessados nos próximos meses. Editores brasileiros com quem falei avaliam que o auge da procura já passou, já que na teoria os estrangeiros estariam traduzindo títulos brasileiros para publicação por ocasião da feira (quando o Brasil será assunto em Frankfurt, com várias mostras em museus e teatros na cidade). Galeno Amorim, presidente da Biblioteca Nacional, acha que ainda haverá crescimento. O ideal, ou a meta, é que o interesse não cesse após a feira, que perdure por pelo menos alguns anos.

Cá entre nós, acho curioso que o país homenageado deste ano, a Nova Zelândia, cuja literatura é pouco conhecida aqui (com lindas exceções, como Katherine Mansfield e Lloyd Jones), não tenha atraído o interesse de quase nenhuma editora no Brasil. Vamos torcer para que os estrangeiros sejam mais generosos conosco do que fomos com os neozelandeses.

Enfim. Embarco hoje à noite, e prometo (mentira) atualizar pelo menos uma vez por dia de lá.

Até!

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A universidade e os direitos autorais http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/06/06/a-universidade-e-os-direitos-autorais/ http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/06/06/a-universidade-e-os-direitos-autorais/#comments Wed, 06 Jun 2012 16:55:05 +0000 http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/?p=1526 Continue lendo →]]>

Capa de álbum da The Copyrights, que não tem nada a ver com o post, a não ser o nome debochado para uma banda do século 21

Semanas atrás, numa daquelas arrumações semestrais de armários que desafiam a física, quando a gente se livra de toneladas de papéis sem liberar nenhum centímetro das prateleiras, encontrei as caixas de xerox reunidas durante o breve período em que consegui conciliar a rotina de repórter de literatura com uma especialização na área, de 2008 a 2009.

Cheguei na época a comprar títulos que me interessavam mais (todo o amor deste mundo para Bakhtin), mas no geral fazia o que recomendavam os professores: xerocava o material deixados em suas pastas para as aulas seguintes. Eram R$ 20, R$ 30, a cada sábado. Uns R$ 400 por semestre ou, somando os três que cursei, R$ 1.200, enviados para reciclagem semanas atrás.

Isso foi só parte dos problemas relativos a textos durante aquele ano e meio.

Por semanas procurei o romance “Catatau” para minha monografia. O livro de 1975 teve segunda edição, revisada pelo próprio Leminski, em 1989, pela Sulina, numa tiragem tão pequena que ninguém viu. A terceira, pela Travessa dos Editores, saiu em 2005. Caprichada à beça, informava Cassiano Elek Machado na Folha, mas em 2008 não estava à  venda em lugar nenhum.

Fui encontrá-lo somente no site Viciados em Livros, em link que hoje aparece quebrado, retirado do ar a pedido da ABDR. Como Murphy é onisciente, onipresente e onipotente, a quarta edição saiu pela Iluminuras um ano depois de eu trancar a pós.

A monografia empacou, mas a empreitada me levou a escrever uma capa da “Ilustrada”, ouvindo editores, autores, administradores e usuários de sites de download. Perdoem o ar novidadoso do texto: era 2009, a Idade Média dos e-books no Brasil, uma época em que a Folha precisava explicar: “Lê-se ‘kíndou”. Ninguém falava da “chamada pirataria digital de livros”, e o site Livros de Humanas, hoje tão centro das notícias, estava só nascendo.

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O  tema voltou na semana passada, no Congresso Cult, quando mediei a mesa “Descaminhos da Literatura”, sobre o destino da criação literária em tempos digitais. Numa discussão com alto potencial para  futurologia, os direitos autorais entraram como rara questão pragmática.

A antropóloga Mariza Werneck lembrou que esse é um conceito relativamente recente, oficializado no final do século 19, na Convenção de Berna, e que, portanto, a ideia de que possa vir a sofrer alterações não deve ser vista com estranhamento. O escritor Joca Reiners Terron seguiu mais ou menos o mesmo caminho, questionando, antes do conceito de direitos autorais, o de autoria numa época em que o artista combina referências pré-existentes.

Antes da resposta do jornalista francês Fréderic Martel, achei importante lembrar que a França é um dos países que mais defendem os direitos autorais. Desde 2003, autores recebem por livros emprestados em bibliotecas. O governo paga uma taxa em razão do número de usuários das bibliotecas (de 1 a 1,5 euro por inscrito), e a associação de autores Sofia distribui os recursos entre autores, editores e um plano de aposentadoria dos autores.

A resposta, portanto, era imaginada: Martel defendeu a necessidade de se estimular a cadeia criativa e produtiva do livro por meio do pagamento de direitos autorais e citou exemplos que considera bem sucedidos nesse sentido, como o da associação de roteiristas norte-americanos.

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No artigo “Em defesa da obra”, publicado meses atrás na “piauí”, Bernardo Carvalho levanta pontos interessantes, embora eu discorde de alguns deles, como a espécie de defesa que faz dos herdeiros. Nesse ponto, fico com Robert Darnton, para quem é um absurdo que direitos autorais perdurem por 70 anos após a morte dos autores.

O argumento mais revelante de Carvalho, para mim, tem a ver com o fato de que em geral a defesa pela circulação de informação atinge só “o lado mais frágil do direito de propriedade, aquele que diz respeito ao trabalho intelectual individual”. O ponto central:

“Nenhuma empresa abrirá mão de suas patentes científicas ou industriais em nome da visibilidade, do bem comum ou do direito à informação. A começar pelas próprias corporações de mídia eletrônica – elas estão interessadas, isto sim, na adoção de um modelo flexível de licenciamento e difusão de conteúdo.

O Google, por exemplo, não pretende tornar disponível a usuários e competidores o saber por trás de seus serviços – e não é por acaso que mantém sigilo desse saber, a ponto de nenhuma informação sobre a empresa aparecer no próprio Google, que em princípio deveria ter acesso a tudo. Ninguém, a começar pelos fundadores do Creative Commons, pensa em pôr em questão o direito de herança e de propriedade sobre bens materiais e corporativos.”

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Quando cito as caixas com xerox, a jornada em busca do “Catatau” e o quanto me ajudou o site Viciados em Livros, é para mostrar que o debate não é tão preto no branco. Eu compraria o livro se a Iluminuras já o tivesse publicado, mas não teria condições de (nem quereria) comprar todos os títulos pedidos pelos professores.

Foi por isso que no mês passado, depois de escrever no Painel das Letras sobre a ação da ABDR, esbocei uma reportagem ouvindo vários lados sobre a questão.

Uma dos entrevistados foi Ivana Jinkings, editora da acadêmica Boitempo, que, por email, disse que a casa “considerou violenta e não está de acordo com a ação da ABDR –entidade à qual não é filiada– que provocou a retirada do ar do blog Livros de Humanas.”

Mas ela ressaltou: “O retorno que a editora recebe é o que a mantém funcionando e o que permite publicar novos livros, alimentando assim o público leitor. É uma cadeia produtiva de subsistência”. Argumentou que “responsabilizar o leitor, a parte mais frágil e também a mais importante da cadeia editorial, é uma covardia. Assim como é um equívoco os leitores culparem as editoras, especialmente as pequenas, pelos preços dos livros no Brasil.”

A solução que propõe passa pelo governo, por incentivos para editoras acadêmicas (que não vendem para instituições públicas tanto quanto as infantis, didáticas e de interesse geral). E que é uma solução similar à imaginada pelo historiador Marco Antonio Villa –que tem, em geral, um posicionamento ideológico bem distinto do de Ivana.

Professor da Universidade Federal de São Carlos, Villa diz não ver alternativa à ampliação de acervos das bibliotecas e questiona, com razão, o fato de essa não ser uma demanda do movimento estudantil. Sua argumentação sobre direitos autorais tem pontos de semelhança com a de Bernardo Carvalho. Como o autor que também é, Villa critica o fato de a defesa de seus direitos ter se tornado algo “pejorativo” nos dias de hoje.

A resposta de Villa que resume o nó que temos pela frente foi a relativa ao uso de fotocópias nas universidades. Indignado, Villa disse que “há um descumprimento”, que “xerocar livros inteiros, conjuntos de capítulos, virou prática disseminada”. Reclamou que o professor transfere ao aluno um custo que deveria ser da universidade. Então perguntei a ele como faz em suas aulas. Ele riu, sem graça, e arrematou: “O mesmo que os outros professores.”

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