Dois séculos de livros em imagens
20/04/12 21:16No século 19, várias livrarias brasileiras lembravam farmácias, e não só porque os livros ficava protegidos por estantes envidraçadas atrás dos atendentes, como se o Ministério da Cultura proibisse a leitura sem receita, mas também pela oferta de produtos. Elas tinham remédios, perfumes, chás. Tinha rapé também, mas rapé a gente não acha mais nas drogarias.
Soube disso pelo “Pequeno Guia Histórico das Livrarias Brasileiras”, de Ubiratan Machado, que li uns anos atrás. O livro conta histórias de cem livrarias, desde os primórdios delas no Brasil, de uma ou duas páginas, no máximo, com textos acompanhados de ilustrações ou fotos em pequena parte dos casos, o que deve ter dado um trabalho de pesquisa do cão.
(Só um parêntese antes de alcançar o assunto, porque digressão é vida: lembrei que o livro fala da primeira “megastore” brasileira, que não seria megastore hoje, é claro, era só grande. Ficava em Belo Horizonte e chamava Oscar Nicolai, como o dono. Nos anos 40, quando a guerra dificultava a importação de obras europeias, ele teve a ideia de oferecer títulos latino-americanos, que ninguém oferecia. Hm. Não lembro como termina a história, então o parêntese acaba aqui.)
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Lembrei desse livro e das fotos cuja pesquisa deve ter dado um trabalho do cão por causa de uma exposição que a editora Unesp abre na terça (24), em celebração de seus 25 anos.
Ela se chama “Impresso no Brasil” e é baseada no livro homônimo, de subtítulo “Dois Séculos de Livros Brasileiros” (2011), com ensaios organizados por Aníbal Bragança e Márcia Abreu. O livro é um apanhado de boas histórias e análises, pena que o assunto tão fartamente imagético tenha saído sem fotos, o que na época lamentei (a gente sempre espera um encarte que seja, embora encartes que sejam encareçam a edição como o diabo). Mas a mostra reúne 90 delas para contar um pouco da trajetória do livro e da leitura no Brasil.
São 30 painéis, com histórias como a da Abril Cultural, que só na década de 1970 vendeu 18 milhões de livros em bancas –incluindo as traduções de “Crime e Castigo”, “Madame Bovary”, “Germinal” etc. que os pais de todo mundo da minha geração (digo, todo mundo que teve sorte de ter pais preocupados com isso) compraram e que, portanto, foram a porta de entrada da literatura adulta para gente a perder de vista.
Outro deles é dedicado à Civilização Brasileira, selo da Record desde 2000, mas que, antes disso, principalmente entre 1959 e 1970, sob comando de Ênio Silveira, destacou-se por seu catálogo e pela edição sofisticada dos livros. Durante a ditadura, Silveira foi preso sete vezes e a livraria da casa sofreu dois ataques a bomba, entre as pressões para que fechasse as portas.
A Companhia Editora Nacional, que hoje publica didáticos e paradidáticos, foi bem importante entre 1925 e 1970. Foi criada por Monteiro Lobato e Octalles Marcondes Ferreira, e tanto seus projetos editoriais quanto seus catálogos viraram referência, como nos dois casos abaixo.
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Esse post tem potencial para se tornar infinito, então parei. E acabei de perceber que o título fala de dois séculos de livros em imagens, mas o post só tem imagens de um deles. Juro que a mostra tem os dois. Fica em cartaz por uma semana só, de terça a sábado, das 9h às 18h (no sábado acaba às 14h), no Instituto de Artes da Unesp (r. Dr. Bento Teobaldo Ferraz, 271, do lado do metrô Barra Funda).
Lembro-me da Oscar Nicolai na minha adolescência, meados dos anos 1960. Era muito boa mesmo. Não sei quando acabou, provavelmente com a morte do dono…
E era assim enorme como dá a entender o livro? Considerando os padrões da época, é claro
Boa noite!
Execelente seu blog. Divulgar a boa leitura é quase que cruzada hoje em dia.
Parabéns. grande abraço.
Gracias, Joandre! Sugestões são bem-vindas! Beijo
Raquel, creio que quem fez a capa do Campos de Carvalho citado acima foi o Poty e não o Hirsh como você colocou. Você possui essa edição? Nos que tem a venda na estante virtual, todos mencionam capa como sendo de Poty.
Tava errado, mesmo, era criada por Hirsh a partir de ilustração de Poty. Arrumei, obrigada!
Raquel, comprei o bendito livro do Campos de Carvalho da editora Civilização Brasileira (consegui uma edição com estado de conservação excelente, já que o livro foi lançado em 1964), e além da capa primorosa do Eugênio Hirsh , o mestre Poty fez algumas ilustrações excelentes dentro do livro. ;-)…..agora só falta arrumar tempo pra poder ler o livro, rs….
Essa é uma das enormes lacunas dos meus conhecimentos literários. Nunca li o Púcaro Búlgaro, e parece ser tããão bom.
mas esse é fininho, da pra ler em pouco tempo, 😉 ….
essa edição do campos de carvalho realmente é ótima. pena que os livros dele, hoje, pela JO, sejam tratados, no aspecto gráfico, como algo de terceira, quarta, linha.
várias já foram as receitas necessárias pra comprar livros no brasil, não? contos de réis, cruzeiro, cruzado, real…
A JO ao menos tem um catálogo precioso, vai. Algo raro no Brasil. Mas podiam ser mais bonitos os livros, sim. E eu quero a receita real, entao =P
se vc conseguir, me passa o nome do seu doutor!
aliás, desde que o waldon (?) comentou aqui que pôs o livro virtual dele à venda na saraiva, confesso que fiquei curioso em saber como. assim, só por desencargo…
Ai, tô devendo isso! Vou atrás, sorry =*
A Biblioteca de Raquel é uma sala acolhedora, de boa leitura e descobertas literárias. A “bibliotecária” trabalha com qualidade e sensibilidade. Parabéns, Raquel!
=)
..ótima a matéria! li e reli os “manuais” da Disney editados pela Abril, como o do “Escoteiro”, e o do “Tio Patinhas”.. E sentimentalismo à parte, a iniciativa de colocar livros em bancas foi sensacional, pois acredito que tenha “formado” muita gente.. Fui tomando gosto pela leitura, na infância/adolescência, por causa das coleções como “Os Bichos”, “Arte nos Séculos” e, claro “Os Cientistas” .. desses, quem é que lembra ?
Os manuais da Disney, que nostalgia. Depois, na faculdade, a teoria que me chegou foi a da Disney imperialista. Sei lá. Só sei que eram meus melhores quadrinhos da infância, depois de Asterix. Deem brioches ao povo =P
Lembro de todos, e recentemente dei alguns dos manuais da Disney. mas mantenho reedições de hstórias do Donald, do Tio Patinhas e do Mickey do tempo em que eram boladas e desenhadas por artistas sensacionais, como o extraordinário Carl Barks. Sei la, quem sabe minha filha um dia se interessa. Senao vou passar adiante tb. Essa teoria esquerdoide sobre a Disney tb existia na minha epoca, tinha ate uns livros pateticos sobre o tema. E por concidencia tenho essa edição do “Púcaro búlgaro”. Um autor sensacional, o Campos de Caravalho
Existem também teorias diretóides. Esses dias descubro que os smurfs eram uma propaganda socialista subliminar para influenciar meu cérebro infantil. Smurf, Small Men Under Red Force, uma vila comunista onde todos eram iguais, tudo pertencia a todos e onde todos eram chefiados por um velho barbudo, o único que usava vermelho (marx ?).
Sem querer começar a eterna discussão de direita x esquerda. Apenas achei legal comentar, já que o assunto resvalou em lembranças da infância e teoria da conspiração
Pera, me perdi na discussão (rs)
Bom trabalho, Raquel.
Abraço
Flávio mc
Gracias!
Gostei da matéria. Devia ser curiosa a época em que os livreiros que comercializavam os livros, de forma semelhante aos sebos de hoje. E como pesquiso a época em que Benjamin Costallat dava seus primeiros passos na literatura (e logo se transformaria numa espécie de best seller), gostei da capa, mas não pude deixar de notar algo estranho ali. Pois é, a interferência de um menu dos computadores, quase no centro da capa. Não deixa de ter lá sua graça…
Hahahahha! Sensacional, nem tinha notado. Ok, eu tenho toc, vou ter que ajeitar isso assim que parar num computador, mas ficou um charme. Legal o estudo do Costallat. Aliás, se não me engano ele aparece também no painel de best-sellers