Alta literatura vs. literatura de entretenimento
23/07/12 00:41Estava conversando por email esses dias com o Felipe Pena, organizador do “Geração Subzero – 20 Autores Congelados pela Crítica e Adorados pelos Leitores”, e comentei que felizes são os escritores que independem de resenhas para ter o trabalho conhecido –caso, entre os autores que ele selecionou, de Thalita Rebouças, com mais de um milhão de exemplares vendidos; André Vianco, que já passou dos 700 mil; Eduardo Spohr e Raphael Draccon.
Os números de vendas desses quatro são muito mais expressivos que os de quaisquer autores brasileiros, jovens, velhos, vivos ou mortos, cujos livros os jornais costumam repassar a críticos para avaliação. Por via das dúvidas, “O Globo” deste final de semana aceitou a provocação e publicou texto de João Cezar de Castro Rocha sobre o “Geração Subzero”.
Pouco depois daquela conversa com Pena, que antecedeu o lançamento do livro, discussão similar veio à tona na mesa de Jonathan Franzen na Flip.
Franzen é um personagem raro no mercado, um best-seller aclamado pela crítica. Figura tanto na capa do austero “New York Times Review of Books” quanto em discussões do clube de leitura de Oprah Winfrey. Acostumado com o gigantesco mercado americano, ficou assustado ao saber que seu “Liberdade” vendeu “só” 20 mil exemplares no Brasil –sem ter noção de que o número equivale a sete vezes a tiragem inicial média de uma obra literária por aqui.
***
Em Paraty, ele comentou: “Estranhamente, [embora venda muito], sinto que culturalmente estou do outro lado. Estou do lado dos que não vendem nada”. O subtexto, levando em conta o tom pouco elogioso que dedicara pouco antes a John Grisham e Stephen King, seria: os maiores vendedores de livros hoje em geral não têm valor literário. Mas ele foi além.
“A literatura está de fato com problemas”, ele disse. “Por dois séculos, o romance foi a forma de arte dominante. Gente como Faulkner, Conrad, podia contar com muitos leitores. Mas hoje o romance não é mais uma forma dominante na cultura. Então, mais do que nunca, é preciso lembrar que ele surgiu como uma forma de entretenimento.”
Aqui ele fez a ressalva de que a palavra entretenimento tem conotação mais negativa em outros idiomas do que em inglês. “Não digo que a meta seja escrever como James Patterson. Mas vivemos num mundo cheio de distrações, então precisamos pensar em como reter a atenção das pessoas. Isso podemos fazer com uma narrativa que atraia. A função do romance sério é usar essa capacidade de suspender as pessoas e ao mesmo tempo ser pertinente.”
Ao mesmo tempo em que admite a mágoa por “não existirem departamento inteiros de estudos sobre Franzen”, ele não quer que a preocupação com a escrita seja central ao ponto de se tornar um empecilho. “Não quero que ninguém pare para pensar na linguagem. Que ninguém diga: ‘Isso é uma metáfora, isso é uma frase formulada com tal objetivo’.”
***
Nesse ponto o discurso de Franzen lembra a defesa que Pena faz no “Geração Subzero”. Com a diferença de que Franzen fala sobre a literatura que ele gosta de fazer, sem criticar as que não aspiram a tal transparência. Na resenha sobre “Geração Subzero”, João Cezar questiona justamente esse ponto: “Como definir o prazer da leitura? No juízo de Paul Valéry, por exemplo, ele se encontra na própria dificuldade. Já no critério de Pena, ele reside na fluência da narrativa.”
Também no “Globo”, mas por outro motivo (achando graça na cobertura em busca de entretenimento que a imprensa, Folha incluída, fez da Flip), Hermano Vianna defendeu o direito “ao morno, ao pálido, e –radicalizando– ao chato” na “alta cultura”.
“Alguns dos espetáculos mais marcantes da minha vida, ou alguns livros que mais amei, foram de uma chatice avassaladora — e só atravessando vastos desertos de tédio (pois sou muito disciplinado) consegui perceber suas belezas. Se a chamada alta cultura perder essa permissão de nos entediar, muitas obras-primas da humanidade deixarão de ser criadas.”
***
De volta às resenhas, por fim. Dias desses, minha amiga Diana Passy me mandou esse texto do Publishers Weekly sobre o impacto de uma resenha na capa do “New York Times Review of Books”, o suplemento literário que mais repercute no mundo.
O PW escolheu seis títulos resenhados e bateu com os números da Nielsen Bookscan, sistema de contagem que mede até 80% das vendas de livros nos EUA. Para evitar interferências, selecionou livros “low profile”, lançados sem campanhas de marketing, sem divulgação extra da editora, como aconteceu com os mais recentes de Toni Morrison e Richard Ford.
Alguns resultados: “Making Babies”, de Anne Enright, teve 234 cópias vendidas na semana anterior à capa do suplemento, na edição de 13 de maio, e 417 cópias na semana seguinte. Resenhado no mesmo dia, mas negativamente, “The Conflict”, de Elisabeth Badinter, vendeu 140 cópias na semana anterior, e 121 na semana da resenha. Na edição de 27 de maio, três livros de economia elogiados tiveram aumento expressivo de vendas. Um deles, “Land of Promise”, de Michael Lind, chegou a vender três vezes mais –subiu de 150 para 636.
A conclusão: o suplemento tem influência sobre os leitores, embora não numa escala grande o suficiente para alterar o destino de um livro –em todos os casos, duas semanas depois da publicação as vendas voltaram a diminuir. Mais curioso do que isso é um detalhe percebido por um dos leitores que comentaram a reportagem no site: é impressionante o quão pouco vendem, em qualquer situação, os livros escolhidos para as resenhas.
No Brasil, as empresas que medem vendas Nielsen Bookscan e GfK estão só chegando ao mercado, então ainda não é possível uma análise do gênero. Já perguntei a editores se resenha em jornal ajuda a vender livro, e a resposta (não me lembro de quem) que mais me marcou foi: faz alguma diferença, pequena, mas não se pode dizer que seja um impacto diretamente no leitor. A questão é que livreiros tendem a deixar mais bem posicionados nas lojas os títulos assim que aparecem na imprensa. Na semana seguinte, muda tudo de novo.
Ora, Raquel, você vai me desculpar, mas isso de existirem apenas “critérios subjetivos”, “mercadológicos”, de “fortuna crítica”, para a avaliação da qualidade de um livro só é verdade para os intelectualmente obtusos e esteticamente insensíveis. Que parece não ser o seu caso. Mas veja, toda a noção do mérito (ou não) artístico de uma obra pode muito bem ser objetivada. Vai me dizer agora que você não consegue enumerar, de uma forma coesa e racional as qualidades estéticas, filosóficas, espirituais, políticas, etc., numa obra como “Guerra e Paz” por exemplo? Ou a ausência de tudo isso num Nicolas Sparks? Claro que você consegue. Mas talvez você se refirá a está palavrinha capciosa, como a outra (a) tal “entretenimento”. Estou falando do “gosto”. Contudo o “gosto”, quando burilado, aparadas suas arestas (isso através do estudo, da refexão, da contemplação, do contato estreito e honesto com as mais altas manifestações da arte) pode também ele ser conceituado.
Então, Raquel, então, Luciana. Os parâmetros que determinam a excelência de uma obra qualquer existem, sim, e devem ser buscados a todo transe. Caso contrário, aceitaremos a mediocridade como única possível moeda de troca. O que, por si só, acabaria por inviabilizar todo diálogo que pretendesse a transcendência, quer das formas, quer das fôrmas.
Olá Raquel!
Pesquiso a produção literária de Ricardo Guilherme Dicke, escritor de Cuiabá – MT. É um texto denso e exige fôlego para a leitura, além de é claro, carregar o rótulo que a maioria dos narradores da região centro oeste ganha de serem regionais. Por isso, é interessante discutir que tipo de literatura estabelecer parâmetros para obras de qualidade literária e obras de vendagem editorial. Seu texto é um bom começo para reflexões futuras.
Oi, Luciana! Acho que isso tudo é muito subjetivo. O próprio Franzen, citado no post, é elogiado pela crítica, embora não seja objeto de estudos mais aprofundados, como ele mesmo diz, e além disso vende bem. Fica mais fácil pensar nesses critérios quando você pega um inegável sucesso popular, como Paulo Coelho, e um inegável sucesso de crítica, como Raduan Nassar. Mas creio que, de todo modo, essa definição parte de critérios subjetivos. Para um estudo como esse, você poderia pegar vendagens dele e o tanto que ele é estudado (ou não) na comparação com outros de sua geração…
“Acostumado com o gigantesco mercado americano, ficou assustado ao saber que seu “Liberdade” vendeu “só” 20 mil exemplares no Brasil –sem ter noção de que o número equivale a sete vezes a tiragem inicial média de uma obra literária por aqui”
Olá Raquel, já que você mencionou isso no seu texto, gostaria de saber o quão gigantesco é o mercado americano de livros. Onde consigo esses números??? abraços…
Oi, Oscar. Olha, números totais agora eu não saberia dizer, embora não deva ser tão difícil encontrar dados na internet, como os da Nielsen. O que se pode dizer seguramente é que as tiragens iniciais lá são sempre muito maiores que as tiragens iniciais daqui. Aqui, uma obra literária costuma sair com 3.000 exemplares na primeira tiragem, enquanto lá pode facilmente sair com 20 mil.
Há leitores para a “alta” literatura e para a “baixa”….
No dia-a-dia do trabalho em biblioteca (e não em livrarias como é a experiência da maioria aqui), noto que parte significativa dos leitores realizam suas escolhas de leitura baseados em gosto pessoal repetitivo. Quero dizer com isso que se ela gosta de um título como “Melância” ou alguma obra do Nicholas Sparks a tendência é ela procurar por títulos com histórias semelhantes. Logo, ouso afirmar que a tendência dos leitores é descobrir determinado autor ou linha editorial e seguir a fila. E como se descobre isso por aqui, normalmente através dos best-sellers que são bastante divulgados e comentados no boca-a-boca ou pela mídia. Casos como Harry Potter e a série crepúsculo deixam bem claro isso, bem como os filmes de amor baseados em romances e até mesmo o efeito TV. Um exemplo: com a minissérie (ou novela, sei lá o que é aquilo) Gabriela da Globo aumentou mais ainda o número de pessoas em busca não só do livro homônimo mas também de outros títulos do Jorge Amado.
Felizmente ou infelizmente, não temos como fugir ainda deste esquema que representa o maior número de livros de ficção e não-ficção vendidos por aqui.
Ao mesmo tempo, vejo que algum tipo de ação no sentido de promover livros da dita alta literatura, premiados ou “antologiados” deve ser massificado para que os leitores comuns (como se nós que somos poucos em relação ao todo, fossemos incomuns, não é?) tenham uma alternativa na escolha do que vão ler.
Para mim, que vejo pessoas lendo sempre as mesmas coisas sem avançar para literatura que as façam repensar, criar e criticar, é um desafio fazer isso sem menosprezar o que vejo dar tanto prazer a elas e que as faz aceitar esperar 30 a 50 dias os best-sellers que não temos em quantidade suficiente em alguns casos.
Raquel, escrever nesse quadradinho é deprimente, ainda mais para quem está com preguiça de abrir o editor de texto e escrever lá e trazer para cá…. risos.
William, adorei a visão de um bibliotecário. Mais do que isso, descobrir que as pessoas escolhem livros como quem vai a um restaurante: pedindo sempre a mesma coisa ;-). Acho que isso renderia uma reportagem, será que as bibliotecas divulgam esse tipo de informação, sem revelar o nome dos frequentadores?
Raquel,
Você, como boa jornalista, sintetizou meus argumentos!
Respondendo a sua pergunta, aqui nas bibliotecas da cidade de São Paulo ainda não conseguimos realizar facilmente esse tipo de levantamento, apesar do sistema utilizado já permitir tal levantamento, entretanto, falta solicitar ao desenvolvedor do sistema a criação de alguns relatórios de obras retiradas por cada leitor e também pelos leitores mais assíduos. Até é possível fazer o cruzamento dos dados de leitores que mais pegam livros emprestados x assuntos, títulos ou autores, mas seria uma pesquisa ainda manual tenebrosa.
Ahh…. estamos ainda focando no desenvolvimento de uma ferramenta que permita ao usuário fazer a reserva e a renovação online para em seguida avançarmos no relacionamento de fato com ele, daí ainda não termos desenvolvido esse tipo simples de relatório… é o preço do atraso.
Olha, mas creio que o sistema utilizado pela Biblioteca de São Paulo permita isso automaticamente, afinal, eles usam um sistema já finalizado!
Para terminar essa monografia, lembrei de um pedido: no sábado, um usuário já idoso que já leu muitos livros da Biblioteca pediu a lista de livros que ele pegou emprestado desde a reabertura da mesma. Ele disse que já chegou a pegar mais de uma vez o mesmo livro (como você escreve: COF) para ler e como era desorganizado a lista o ajudaria a completar a leitura de autores nórdicos e de ficção policial… Enfim, eis a falta que o uso humano da TI me faz!
A verdade é que toda literatura é, grosso modo, de entretenimento, seja a literatura preocupada exclusivamente com a trama, seja a que concerne mais a linguagem que qualquer outra abordagem. Afinal de contas, para que diabos uma pessoa se predispõe a ler ficção senão para se entreter por curto ou longo espaço de tempo?
Oras bolas.
Grato, Raquel.
Não, depois da capa não fica ruim. Mas não se lê com o mesmo grau de tensão. (Aquela tensão que não cai desde a primeira linha de A Sangue Frio – mais um exemplo de entretenimento e boa literatura)
Por último: sou mesmo Urariano. Mas 99, 999…% em cada 100 pessoas me põem como natural de Urano.
;-).
Seguindo a boa literatura, em vez de apresentar respostas, eu vou fazer algumas perguntas.
O que é alta literatura? Quais são os leitores que os escritores querem para seus livros?
Não deveríamos discutir apenas se um texto é bem escrito? Se temos um texto bem escrito, que é atraente a qualquer tipo de leitor, não deveria bastar para considerá-lo boa literatura? Será que não há uma fatia preconceituosa do mercado que deseja apenas uma elite de leitores e escritores, que está pouco se importando para o aumento de leitura no país?
Alta literatura parece que está sempre associado à elite, a uma classe inatingível. E de outro lado, vemos uma classe C lendo, lendo cada vez mais, consumindo mais cultura, de uma forma ou de outra. Eles podem não estar preparados ainda para o poder que a Clarice nos passa em seus textos, mas eles podem consumir com gosto os romances do Mario Vargas LLosa, e dele facilmente passar para Borges, Garcia Marquez, Machado, Ian McEwan, Roth, Kafka, entre tantos outros.
Se alguns bestsellers incomodam tanto pela qualidade (concordo que tem muita coisa ruim, mas não generalizo, pois tem uma fatia que se salva), será que o mercado não deveria abrir espaço para os autores nacionais que escrevem bem, numa linguagem acessível a todas as classes?
Pois eu vejo na mídia uma concentração de atenção a poucos, quando há muitos bons escritores, premiados inclusive, que não recebem todo esse flash. Quando um texto mais popular vem e alcança seu lugar junto ao público, ele logo recebe uma etiqueta negativa.
Acho que falta a escritores e críticos a busca pelo bom texto, essencialmente isso. O resto são caminhos que tomamos para chegar nos leitores, o que efetivamente deveria importar.
Não devemos ter textos apenas de uma forma ou de outra, devemos ter textos que agradem a todos os públicos, que envolvam cada leitor, de sua forma especial. Haverá uma classe no topo da pirâmide que preferirá um texto que não é consumível, é, de outra forma, quase uma tese em forma de ficção. Que mal há nisso? Não vejo nenhum. Mas existirá também o livro consumível, que mesmo assim deixará um universo em aberto ao virar da última página, que deixará o leitor com novas questões, novas ideias.
Dou um exemplo clássico. Adoro os livros da Clarice Lispector tanto quanto adoro os livros da Lygia Bojunga. No primeiro, minha leitura é mais lenta, é de idas e vindas, é de avanços e retrocessos, para que cada frase ganhe a força necessária. No segundo, minha leitura é ávida, mas me sinto quase afogada de tanta sensibilidade trabalhada em cada frase. Mas não há quem possa afirmar que a literatura de uma é menor do que a da outra, pois ambas são geniais, cada uma ao seu jeito. É isso que devia mudar no pensamento do mercado. Respeitar o estilo de cada um, e valorizar o que cada escritor tem de melhor. E, principalmente, abrir espaço para o autor nacional.
Fico imaginando a frustração do Franzen ao descobrir que só vendeu 20 mil exemplares aqui, frente ao que vendeu lá fora. Mas o que ele sentiu não chega nem perto do sentimento de uma centena de bons e ótimos escritores que têm essa decepção mensalmente, por números infinitamente menores. Deveríamos nos preocupar apenas em disputar o colo de nossos leitores, mas há uma guerra no mercado que faz com que para cada passo que nós damos na direção dos leitores, os “preconceitos e teorias” nos empurrem dois passos para trás.
Lanço aqui minha campanha a favor dos nossos escritores (e a ela me incluo):
– Que as livrarias reservem um percentual de suas vitrines para os autores nacionais
– Que as livrarias reservem uma bancada exclusivamente para os autores nacionais
– Que as listas de mais vendidos tragam uma lista exclusiva da literatura nacional
– Que os cadernos literários publiquem, no mínimo, uma resenha de cada gênero de ficção da literatura nacional
Oi, Ana! O “alta” é citação ao texto do Hermano, assim como o “entretenimento” veio da fala do Franzen e da orelha do livro do Pena. Não houve intenção de referência a elite, mas entendo que leituras diferentes possam levar a essa ideia. Sobre concentração, puxa… Sempre gosto de convidar as pessoas a virem à redação. Recebo uma média de 50 livros por semana, isso porque costumo receber só literatura e produção acadêmica, sem considerar técnicos, didáticos, infantis etc. Em geral, entre notas e matérias, conseguimos dar destaque a no máximo sete, oito livros por semana na Ilustríssima, numa semana boa. Daí você imagina.
Mas a literatura nacional está sempre lá. Ela recebe muito mais espaço nos cadernos de cultura do que o cinema nacional na comparação com o internacional, por exemplo. E tanto aqui na Folha quanto no Estadão existe uma preocupação genuína em dar espaço para as pequenas editoras; isso é algo que ouvi de editores tanto daqui quanto de lá. É claro que as editoras grandes produzem muito mais e, por isso, acabarão aparecendo mais. Mas pode prestar atenção inclusive no Painel das Letras, a coluna que assino aos sábados na Ilustrada: invariavelmente há notas sobre a produção de pequenas editoras. Mas é mais fácil olhar en passant e dizer que os jornais só dão espaço para as grandes. Mas é preciso lembrar que menos de dez editoras do Brasil respondem por, sei lá, 60% dos lançamentos.
De todo modo, é o que falo lá em cima no post: uma autora como Thalita Rebouças já está mais do que bem amparada pelo próprio sucesso. De todo modo, vejo nos jornais espaço tanto para Ignácio de Loyola Brandão, com sua literatura absolutamente acessível, quanto para Raduan Nassar, que exige esforço, que chega a cansar antes de agradar. De resto, acho que existe muita reclamação direcionada a todos os lados –editoras, mercado, imprensa– sem que exista um “culpado” de fato.
Obrigada pelos comentários pertinentes, acho sempre importante uma boa argumentação em vez de uma discussão vazia.
beijo, Raquel
(p.s.: vitrine eu não digo, mas que eu saiba toda livraria tem pelo menos uma bancada só para literatura nacional)
Oi, Raquel!
Eu tinha entendido que o “alta literatura” foi extraído do texto do Hermano, assim como o termo entretenimento veio do Pena. A minha ideia não foi criticar o post, mas jogar luz nesses termos. A ideia de elitizar, na minha visão, é de alguns artigos que são publicados, como esse texto do Hermano.
Puxa, eu realmente imagino a quantidade de livros que chegam para vocês resenharem, além de todo trabalho para fechar as edições. Acompanho seu trabalho, principalmente a sua coluna Painel de Letras. E gosto muito. Aliás, eu publico um clipping dela no jornal virtual que edito, focado em literatura nacional. Olha que ele é mensal, mas é uma guerra para conseguir fechar cada edição.
Por isso tudo imagino o trabalho tanto quando sinto que o espaço melhorou muito. Contudo, vejo que ainda saímos perdendo de alguma forma. Independente dos títulos nacionais serem produzidos por pequenas ou grandes editoras, tenho a impressão que os escritores precisam ganhar algum tipo de selo para garantirem esse espaço na mídia, algo como um prêmio literário ou o apoio acadêmico. Sem citar nomes, vejo cadernos literários abrindo espaço para política, história e outras áreas, quando o espaço para literatura já é tão pequeno.
E isso para a literatura adulta, se formos debater a literatura infantojuvenil a situação fica muito mais complicada.
Realmente vejo os jornais abrirem espaço para o Ignacio tanto quanto para o Raduan, mas ambos já são consagrados. É como se o espaço para quem está começando tivesse que vir com esse selo, ou como vejo acontecer, com o selo da posição dos mais vendidos.
Mas talvez seja preciso separar espaço para resenhas de espaços nas colunas mais focadas como é o Painel das Letras. Ali, há muita divulgação da literatura nacional e eu te dou os parabéns. Esse meu resmungo (rsrs) é para as resenhas. Vejo muito mais resenha de livro estrangeiro do que livro nacional. Já teve edição antiga que contabilizei e perdemos de zero. Pior do que goleada em campeonato brasileiro. rsrs
Concordo contigo num outro ponto. Há muita reclamação e não acho que exista culpado. Talvez só falte uma união, uma ausência de visão que concentre esforços a um só objetivo. Uns querem ser resenhados, outros querem ser considerados alta literatura, outros querem vender muito, outros querem conquistar leitores etc. Mas parece que se torna heresia quando um escritor quer unir mais de um desses itens.
Sobre as livrarias, pelo que tenho visitado, encontro as prateleiras de literatura nacional, mas não as bancadas, aquelas em destaque.
Adorei trocar essas ideias contigo.
Beijo grande,
Ana Cristina
Raquel, a primeira parte do seu post, antes da ilustração da capa do New York Times Review of Books, é muito boa. E, de modo adequado, realiza ela própria a união de entretenimento (aquilo que se lê com atenção e prazer) e carinho à inteligência. Essa é uma discussão que vai muito além do post e bem caberia em substancioso livro e ensaio. A vontade que dá – se coubesse espaço em um comentário – é de particpar da discussão com outro texto.
Tentei brincar com o assunto pela vizinhança, a pretexto de achar uma fórmula para um best seller, e publiquei no Blog da Boitempo, http://boitempoeditorial.wordpress.com/2012/04/10/o-amor-verdadeiro-de-madre-teresa-ou-como-escrever-um-bestseller/
Opa, Uraniano, vou linkar no post! E depois da capa o post fica ruim? rsrs. Desculpe =P. E obrigada pela parte boa =)
Você está de parabéns, Raphael, achei que eu era o único a pregar no deserto. É sim necessário, sem demagogia ou cartelismos, estabelecer parâmetros de qualidade na produção literária. E se for preciso radicalizar, radicalizemos. Essa pseudodemocracia, que compele o indivíduo a tolerar toda e qualquer manifestação, não importa sua procedência ou grau de excelência, precisa ser revolucionada, nem que para isso seja preciso restabelecer algum nível de censura, algum mecanismo que possa salvaguardar, pelo menos minimamente, a inteligência e a sensibilidade do leitor em formação. Em outras palavras, que não o degrade a ponto de embrutecê-lo, de torná-lo insencível aos imensos munumentos estéticos e humanos da alta literatura. E para alcançá-los, não vamos nos iludir, é necessário esforço, concentração, estudo. Mas a graça está justamente aí. No sermos desafiados, confrontados e, às vezes, porque não, também derrotados. Mas é uma derrota honrosa. Honrosa porque não humilha, porque não rebaixa. E nisso já há um componente de vitória. E ele está na própria aceitação do desafio.
Certo, tem a questão do entretenimento. E essa palavra é mais uma daquelas que se tornaram, por um lado, o cavalo-de-batalha daqueles que apregoam o fácil acesso ao universo do livro; e por outro, o dragão asqueroso que precisa ser aniquilado. Já que as páginas de um livro são o território arqui-sagrado onde se processa, de uma forma articulada e consequente, o embate do melhor e do pior que há em nós mesmos enquanto criaturas racionais. Portanto, não pode ser conspurcado, à semelhança da televisão, cinema, etc. Particularmente, por vocação e convicção sou levado a me perfilar com os segundos e lutar para proscrever o famigerado conceito de entretenimento. Prefiro buscar nos livros que leio o conceito de LUDICIDADE, e percebo que ele está presente nos melhores, mesmo nos mais “difíceis”. E ser lúdico, no caso, significa ser prazeiroso, significa ser desafiador e, naturalmente, ser edificante.
Amigos, como um dos autores da Subzero, aqui vai a minha opinião sincera.
Sou um cara que veio do mundo dos quadrinhos, especialmente super-heróis. Eu quase não lia quadrinhos europeus, geralmente mais cabeças. Eu gostava das revistas regulares, com megassagas, páginas duplas… Eu enchia os olhos com histórias assim.
Posso dizer que essa foi a minha base de leitura por tempos. Livros? Li uns clássicos dos quais mal lembro e rapaz de escola pública, li Machado e José de Alencar para prestar o vestibular e li Dom Casmurro, A volta ao mundo em 80 dias do Verne e outros livros quando a minha tv pifou isso em… 2003.
De lá pra cá, leio os livros que me interessam, infelizmente muitos mais técnicas de roteiro e de autores que acompanho o trabalho, como Max Mallmann, André Vianco, Felipe Pena…
Ou seja: sou um representante da população deste país que lê pouco e vê com nojo quando seres cultos querem segregar as outras pelo que ela sabe ou não sabe, das técnicas que dominam ou não.
Sobre egos: quando uma pessoa faz uma analogia autores = joelmas / livros = micaretas, para mim isso é uma tentativa de eternizar uma frase no melhor estilo Jabor. Não há um muito de ego nisso?
Vocês estão levando a proposta da antologia muito ao pé da letra. Se muitos julgam o livro pela capa, outros tantos estão julgando pela introdução.
E não é um sublivro, se não gostam do organizador, respeitem pelo menos os autores. Melhor LEIAM os autores, opinem, mostrem que vocês querem uma literatura forte e que vocês querem eles nesse patamar imaginário. Ou não.
Tive um professor na Universidade Federal do Espírito Santo que confidenciou a uma amiga que eu, seu aluno, “Nunca seria alguém na vida, pois eu não tinha cultura acadêmica.”
Essa amiga virou a minha esposa. Hoje eu estou numa coletânea com uma galera (não o da Granta) que venderam mais do que sonhei vender.
Respeitem a trajetória desses caras. A maior parte dos escritores que vocês veneram tem 60, 80 e 200 anos. A gente ainda pode chegar lá.
Li alguns dos autores da Subzero e devo dizer que, se eles ainda não estão naquele patamar mais alto em que são considerados como uma literatura de qualidade, pelo menos alguns mostram que tentam. O problema dos egos, Estevão, é que na hora em que os autores se propuseram a fazer parte da dita antologia, eles assinaram junto com o organizador sua proposta, aquele texto que questiona a “crítica especializada” e argumenta que seus autores são “congelados” por ela. Para quem não liga pra essa “crítica”, uma declaração dessas soa como “dor de cotovelo”. Virou um “manifesto” que foi sabotado pela falta de qualidade de alguns dos autores incluídos na antologia, prejudicando a forma como os outros serão vistos – mas eles não ligam, não é verdade? O mesmo vale para a “Granta”, em que a qualidade dos textos ficou discutível no todo. “Entreter” é uma arte, mas é preferível quando ela anda de mãos dadas com a boa forma – e não falo de escrita, estilo, cacoetes, etc., mas sim de fugir de lugares-comuns e clichês. Dito isso, gostaria de parabenizar seu trabalho com “Os Passarinhos”, que acompanho há tempos.
“Os Passarinhos” rules! 😉
Brigadíssimo, moça!
Eu adoro “Os Passarinhos”!
O curioso nessa história toda é a “lógica engessada da coisa”:
– alta literatura = aceita pela crítica e chata
– literatura de entretenimento = rejeitada pela crítica, mas aceita pelo povão, e “cool”
Dickens foi um dos caras que mais vendeu livros em sua época; foi editor de jornais, etc. etc., e hoje é considerado “alta literatura”, um clássico, ou seja, foi sucesso de público e crítica… Eu acho que o “Assassinato de Roger Ackroyd” é uma obra-prima da narrativa e foi escrito pela “dama do crime”, Agatha Christie… outro sucesso de público até hoje…
Eu não li as duas antologias em questão (e acho que nem vou ler – em 2012, minha meta é dar conta de “Pickwick” e “Our Mutual Friend”…), mas, do ponto de vista da coerência, acho curioso que o pessoal da Subzero – que conheço de nome e, alguns, de vista – para se afirmar pareça usar justamente aquilo que renega: a crítica… haja ginástica lógica!
Enfim, não sou contra nem a favor, muito pelo contrário, e gosto de Dickens, Machado, Chesterton e simplesmente nunca consegui ler Clarice, acho Joyce (salvo “Dublinenses” e “O Retrato…”) um saco, e juro que acho que o pessoal que elogia o Murakami nunca conseguiu terminar de ler um livro dele…
Gostei da “ginástica lógica”, vou adotar ;-). Sobre a lógica engessada, tentei usar o Franzen como exemplo para desconstruir o título, mas aparentemente não funcionou, hahaha. Droga
Ei, o Murakami é demais! 😀
Ei, Ana! Bom te ver por aqui.
Bj.
Bruce, eu te entendo. Eu acho válido o diálogo, mas não me sinto o mais indicado para continuá-lo. Ah, sim: eu me incomodo com críticas, porque não escrevo apenas para mim. Se faço algo que não agrada, metade da missão não foi cumprida.
Obrigado mesmo por falar dOs Passarinhos.
É um material feito com muita paixão (eles estão de férias por causa de uma adaptação para quadrinhos de “Da Terra à Lua” que estou fazendo), mas logo teremos novidades.
Abraço!
E.
Alta literatura é entretenimento. E é isso que ninguém entende.
O dito entretenimento acontece ou deixa de acontecer de acordo com o leitor; telespectador e etc.
Qualquer leitura feita de forma não-obrigatória, no tempo livre do tal ser humano que está lendo, é leitura de entretenimento.
Alguns vão usar esse tempo livre para ler Crepúsculo, outros para ler Clarice. E isso se aplica a tudo, uns no tempo livre preferem ver a novela, e tem gente que tá vendo filme iraniano.
Então não é alta literatura vs literatura de entretenimento. É literatura aprovada pelos pares, críticos e etc, e literatura renegada. E se elas são consumidas no tempo livre das pessoas, são de entretenimento.
Esses pares, viu. Te falar uma coisa.
hahahahaha
😉 .
Muito bom texto. Procure no google: LIVRO CIBERCÉLULAS. Este livro irá te surpreender!
Excelente post Raquel.
Um livro sair na mídia, ser resenhado, não faz muita diferença mesmo.
Adorei a passagem: ´´Na semana seguinte, muda tudo de novo´´. rs.
Sempre me pergunto: Será que um escritor divulgar um livro no Programa do Jô faz alguma diferença? Sempre pensei que não faz diferença alguma. Pelo visto eu estava certo.
Acompanho com regularidade seu blog, até roubei uma foto dele para colocar no meu facebook. Abs
Oi, Rafael, obrigada!
Olha, o comentário de quem já esteve no Jô é que faz diferença nas vendas, sim. Pontual, mas faz. TV tem muito mais repercussão que jornal impresso, de todo modo…
Volte sempre e comente, todas as sugestões são bem-vindas 😉
Para mim, o que falta é apenas o estímulo para que os leitores da ‘Geração Subzero’ passem a ler a ‘alta literatura’. Eles já gostam de ler, precisam do empurrão.
A ‘alta literatura’ não é modorreta, é o contrário disso. Mas ela demanda mais tempo, mais solidão, mais cuidado.
Comecei a ler intensamente com Harry Potter (tenho 23 anos), André Vianco, e com o tempo, por meu desejo de ser escritor, passei a conhecer coisas novas, a buscar outros livros, os clássicos (estes best-seller foram importantes para minha formação de leitor).
Devia-se investir nesta aptidão de leitura dos jovens que leem a Geração Subzero. Caso contrário, eles deixarão de ler no futuro.
As editoras, o governo deveriam investir mais nos seus próprios autores, em vez de investir apenas no lucro.
Primeiros capítulos de livros de autores nacionais, por exemplo, podiam ser distribuidos junto aos best-sellers. Pra interessar os leitores a outras coisas.
Botem um conto do Caio Fernando Abreu junto a um best-seller. Um Lygia. Um Noll. Um Carrero.
Se as editoras quisessem, muitas ações poderia ser feitas…
Essa do primeiro capítulo encartada nos best-sellers é boa, Renan. E vc é um filho de Harry Potter! =) HP foi um fenômeno mundial nesse sentido. É certo que muita gente acabou ficando só na “literatura para entretenimento” (vou usar suas aspas também rs), mas de fato a série levou muita gente que não lia a ler.
Sou filho do HP e já estou criando a neta. Minha prima já lê HP e Monteiro Lobato. E tem adorado.
Depois, eu mesmo coloco o tal primeiro capítulo na cabeceira dela. Por enquanto, tem que ser assim… rs!
Acho super válida essa discussão sobre a literaturas “alta” e “de entretenimento”. Mas penso que, às vezes, muitas pessoas que batem arrogantemente no peito dizendo que só leem clássicos esquecem que estes mesmos livros, originariamente, foram lançados como folhetins de puro entretenimento.
Entendo que muitos desses livros ditos de entretenimento não têm lá a melhor qualidade literária do mundo, mas acho preferível a pessoa ler um livro desses do que não ler livro nenhum. Na verdade, é a maneira de trabalhar a leitura desse livro que faz toda a diferença: um Crepúsculo bem trabalhado pode fazer um leitor interessar-se em ler um Drácula, por exemplo. E aqui tá todo mundo careca de saber que – de um modo geral – a literatura é muito mal trabalhada em sala de aula, tornando-se a palhaçada que é hoje em dia, em que alunos leem resenhas na internet para fazer suas provas previsíveis – sendo a apoteose disso os grandes vestibulares, mestres na arte de assassinar o gosto da leitura nos estudantes.
Crepúsculo é um bom exemplo, Cássia –graças a ele, O Morro dos Ventos Uivantes voltou às listas de mais vendidos, pelo menos no Brasil. Isso é um feito e tanto
Com certeza!
É muito simples desmerecer um Crepúsculo, mas se ele leva a um Morro dos Ventos Uivantes, o ganho do leitor será incrível. Enquanto que um clássico como (Deus nos defenda!) Macunaíma, por exemplo, pode fazer com que a pessoa desista de vez da literatura modernista.
Hoje em dia meio que é “chique” para algumas pessoas difamarem a literatura de entretenimento e dizerem que só leem os clássicos. Entretanto, muitos desses leitores de clássicos fazem uma leitura superficial, como se estivessem lendo uma revista dessas bem xexelentas; aí eu pergunto: qual o mérito de uma leitura dessas?
Eu sempre bato nessa tecla: mais vale começar a ler por um Crepúsculo do que nunca ter lido nada, como muitos se orgulham ao dizer. Assim como Harry Potter, são essas obras que formam novos leitores. Meu primeiro livro marcante foi da Série Vaga-Lume, um livro juvenil do Marcos Rey que abriu caminho para, 7 anos mais tarde, eu me encantar com Clarice Lispector ao ponto de cursar Letras só para saber mais desse mundo… Não tiro o mérito de obra pop não, mas um ponto deve ser observado: que seja o início, não o único estágio de um leitor.
“Que seja o início, não o único estágio de um leitor.”
Não é bem isso que eu ando vendo por aí. Talvez a utilização dessas obras de forma acompanhada e guiada ajudasse para instigar os leitores a irem além, mas vejo que muitos ficam viciados nos temas e não expandem seus horizontes. 😛
Luiz Eduardo Matta, um dos autores da Subzero é um escritor competente e muito criativo. Ninguém vai me convencer que ele escreve mal ou que maltrata a linguagem… Um dos livros dele é da coleção Vaga Lume.
Caraca, lembro muito dos livros da série Vaga-lume, mas eu gostava mesmo, quando pequeno, das histórias do Cachorrinho Samba, da Maria Jose Dupret…
O cachorrinho Samba! <3
“[…] graças a ele [“Crepúsculo”], O Morro dos Ventos Uivantes voltou às listas de mais vendidos, pelo menos no Brasil.”
Agora pergunta quantos leram até o final? 😀
(Brincadeirinha.)
aliás, “tess” do hardy voltou a ser lido por causa de “cinquenta tons de cinza”… eu cresci lendo agatha christie e vendo hitchcock nas reprises da tevê… o problema não é o entretenimento (na literatura, no cinema, etc.)… é a qualidade da obra que conta… mesmo para ser entretenimento deve ter um mínimo de qualidade, coisa que não vi no “sublivro”…
É, agora vamos esperar pelo número de leitores que vão ficar “super felizes” com a obra do Hardy.
O que o Felipe Pena faz não é uma defesa do entretenimento na literatura, uma defesa desse tipo seria defender Graciliano Ramos em lugar de Guimarães Rosa ou Conrad em vez de Joyce, seria defender Rubem Braga, Fernando Sabino e outros. Mas apenas para lembrar à crítica que a boa literatura não é necessariamente a mais difícil, e nunca para atacar a literatura mais difícil. Porque se a literatura difícil fosse invalidada, perderíamos Virgínia Woolf, Kafka, Proust, Faulkner e o próprio Joyce e o Rosa, cada um difícil a sua maneira. E não foram eles alguns dos maiores (senão os maiores) escritores de todo o séc. XX? Então perderíamos o auge da cultura literária de todo um século, e a um escritor que defenda isso eu nem sei que nome dar.
O que o Felipe Pena faz é defender a literatura ruim, a literatura clichê, a literatura que não tem nada além do entretenimento, uma literatura vazia. E uma literatura dessa forma, que renega qualquer preocupação com a qualidade também deveria deixar de se preocupar em ser bem criticada, porque se ela renega o trabalho da linguagem, renega também a própria essência da arte em literatura, então deveria ter a decência de aceitar que a crítica (que é quem deveria defender a qualidade literária) fale mal dela. Digo isso porque, em minha opinião, um escritor que defende textos “sem a preocupação de produzir experimentalismos e jogos de linguagem” defende uma literatura ausente de tudo que levou a literatura a qualquer êxito em qualquer época, porque de Cervantes a Günter Grass ou de Lima Barreto a Bukowski, sempre houve experimentalismos e jogos de linguagem. E não são apenas os escritores difíceis que experimentam e fazem jogos de linguagem, quem faz isso são os bons escritores, porque isso é a base de qualquer trabalho literário, experimentar e criar uma linguagem que traduza da melhor maneira a história que se quer contar, seja de uma maneira difícil ou não.
Os escritores da coletânea Geração Subzero não deveriam ficar ofendidos com a crítica, eles já vendem mais que os outros, e deveriam se contentar com esse lugar. Eles são os Latinos e Joelmas da literatura brasileira, são as Ivetes Sangalos, seus livros são as micaretas das letras brasileiras, eles representam a realidade de uma enorme parcela da população brasileira que não consegue consumir uma cultura que não seja feita em forma de clichês e ideias mastigadas. Eles refletem essa realidade, e não deveriam querer impor sua aceitação pelo outro lado, o lado da boa literatura.
O que esses escritores da coletânea organizada pelo Felipe Pena fazem é muito diferente do que faz um Veríssimo, ou o Dalton Trevisan, por exemplo, afinal, o que há de difícil nos textos dele? Não se deve confundir, e o perigo é que isso ocorra. E então teríamos o reverso do que uma defesa séria do entretenimento em literatura procura combater, em vez de uma literatura para eleitos, hermética, uma literatura para escritores, como único padrão de qualidade, teríamos uma literatura sem padrão algum, onde a qualidade do texto seja irrelevante e apenas importe que o leitor mate seu tempo enquanto lê o livro, um livro que vai ser esquecido logo em seguida, porque não acrescenta nada, nem a literatura nem a quem lê, um livro que poderia ser substituído por outro parecido porque são feitos em série, algo impossível na boa literatura. E o perigo é que isso ocorra. E a crítica não pode ter medo de apontar o que é ruim ou bom em literatura, esse é o trabalho dela, porque o que entretém, os próprios leitores decidirão por si, como sempre ocorreu. Aliás, se tivéssemos uma educação melhor no Brasil, teríamos muito mais gente se entretendo com gênios tão diferentes como Rubem Braga ou Machado de Assis, em vez de com escritores subzero-qualidade.
Ei, Raphael! Discordo, não sou Latino coisa nenhuma! Sou o Péricles!
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=365117840228329&set=a.214355351971246.53425.156561047750677&type=3&theater
Abraço!
ótimo comentário.
Esse “manifesto” da “Geração Subzero” me pareceu interessante, o problema é que há ali alguns autores que sabotam o próprio projeto – que nem na Granta. Lugares-comuns, clichês, estrutura previsível, etc. Não espero que ninguém faça algo revolucionário, mas se for para entreter, que faça direito!
(Só acho que o tom do seu comentário foi um pouquinho agressivo).
não acho que o raphael tenha sido agressivo, não. acho que há um problema conceitual aí, isso, sim. literatura de entretenimento é uma coisa, literatura ruim é outra. e o “sublivro” é uma coletânea de clichês que sequer dão conta de entreter. vale dar uma lida em qualquer livraria por aí. as letras nunca foram tão ofendidas… ainda assim, há espaço para todo mundo e, na verdade, o “sublivro” é um grande factoide, como tantos outros na literatura… o mesmo organizador do volume está agora oferecendo prêmios em dinheiro para o blogueiro que escrever a melhor resenha para o livro dele… bom, não sei nem como nomear um ato desses… não é autopublicidade, é baixaria pura e simples… aliás, outro detalhe: os 10 melhores blogueiros participarão da banca para a próxima coletânea dele… sem comentários… é triste, viu?!
No final ele foi um tantinho, sim. Concordo que há um problema grave nessa coletânea, que é a de satisfazer os egos de autores que não são levados a sério. Contudo, o mesmo vale pra G*****, só que no caso contrário. Eu mesmo não vi necessidade no lançamento de um livro como esse, principalmente porque eles são mais conhecidos e lidos que todos os autores da G***** juntos. Espero que os autores da bendita Subzero melhorem sua escrita, de verdade. Eles tem ideias boas, mas a aplicação ainda fica a dever.
Não sei se fui agressivo, Bruce, e se fui não foi intencional. Mas há realmente problema em ser agressivo? Não sei se ser agressivo chega a ser mal-educado. Mas enfim. O que eu queria deixar entendido, é que esses escritores representam o mesmo fenômeno que leva o Fernando Meirelles, como produtor do filme Xingu, a dizer que não filmará mais no Brasil porque faz um filme inteligente e ninguém vai ver, que se soubesse teria vendido o filme como um filme de ação porque os brasileiros só vão no cinema ver tiro.
É um dentre vários resultados de uma educação tão ruim, de um povo que quase não lê. E é justamente porque o brasileiro lê pouco que são esses escritores apenas os que vendem tiragens maiores, porque se tivéssemos a cultura de ler, todos venderiam mais, porém, desenvolvendo o hábito de leitura, muita gente aprenderia a diferenciar a boa da má literatura, a literatura séria (difícil ou não) da literatura vazia e construída sobre lugares-comuns, e então os escritores de qualidade teriam um público maior e também venderiam bem.
E talvez seja difícil para muita gente, principalmente quem está aprendendo a gostar de livros agora, os mais jovens, fazer alguma diferenciação sobre a qualidade. A crítica deveria fazer essa seleção, mas com disse Antônio Cândido, que entende mais de literatura que qualquer um de nós, a crítica universitária brasileira não se arrisca, não analisa autores novos, apenas autores bem conhecidos, com vários estudos já feitos sobre eles, e acaba que fica um vazio no lugar de quem deveria fazer esse papel e indicar quem são os bons autores novos. E isso leva ao fato grotesco de escritores assumidamente despreocupados com a qualidade do que escrevem quererem ser levados a sério. O que é um problema, pois um escritor que não se leva a sério quando escreve não merece ser levado a sério pela crítica, então não cabe choramingar e se dizer injustiçado.
Não digo que “agressivo” seja sinônimo de “má educação”, apenas me referia às comparações com “micaretas”, “Joelmas”, etc. – engraçadas, aliás. Contudo, você tem razão, Raphael, tá difícil levar a sério uma coletânea de autores que dizem que não ligam para a crítica mas que ainda assim choramingam quando ela não os leva a sério. Por que será, não é mesmo? O problema dessa literatura defendida por eles é que ela se baseia em clichês e lugares-comuns que já deram até demais. Bacana quererem explorar novas tramas, mas por que escrever de forma vazia e repetitiva? Acho o máximo que alguém queira escrever um thriller nacional, mas por que precisa emular um Forsyth ou Koontz piorado? Ou terror, mas por que precisa reescrever algo como Stephenie Meyer? (São exemplos de uma tendência, não estou dando nomes aos bois, quero deixar isso bem claro.) Mas como disse abaixo, o problema não é haver esse tipo de literatura, mas sim que ela seja a fonte principal da maioria dos leitores. Dizem que “Tess of the Urbevilles” vendeu mais desde o lançamento de “Fifty Shades of Grey”, mas confesso que dou muita fé que o público-alvo do último leia a obra de Hardy até o final; o mesmo digo para “O Morro dos Ventos Uivantes”, “Romeu e Julieta”, “Orgulho e Preconceito” graças a “Crepúsculo”. Ainda estou no aguardo por opiniões sobre esses romances por parte das leitoras de Meyer. Como eu disse antes, não levo a sério nem a G***** nem a Subzero porque me parecem exercícios de satisfação de egos alheios, uns para terem o prazer de ser publicados em um veículo elitista, outros para tentarem ser vistos como autores sérios e “transgressores”.
Correção:
“Dizem que ‘Tess of the Urbevilles’ vendeu mais desde o lançamento de ‘Fifty Shades of Grey’, mas confesso que NÃO dou muita fé que o público-alvo do último leia a obra de Hardy até o final; o mesmo digo para ‘O Morro dos Ventos Uivantes’, ‘Romeu e Julieta’, ‘Orgulho e Preconceito’ graças a ‘Crepúsculo’.”
Raquel, excelente o texto do Professor João Cezar de Castro Rocha…Valeu por colocar o link.
Ele é bom, Marcelo. Costuma colaborar para o Estadão e para o Globo, vale acompanhar
Fiz oficina de crítica literária com ele e consegui encontrá-lo na FLIP (ao contrário de outra pessoa, cof).
Sempre bons os cafés com ele e as discussões! ^^
Um dos maiores problemas do país, relativamente à literatura, é o estado em que se encontra a educação formal. Faz pouco, lia um texto em inglês para alunos estrangeiros aprenderem a língua. Uma página de texto e duas com perguntas sobre o texto! As perguntas eram, praticamente, um diálogo com o escritor. Um texto simples, básico, cujo estudo me deixou curioso: “Como eu não tinha visto isso antes? Estava tudo ali?” Neste aspecto, os americanos nos batem de goleada.
A alta literatura exige que o leitor tenha algum conhecimento de história e alguma erudição, além de bom vocabulário. Dostoiévsky, p.ex., é excelente, mas é preciso entender por que escreveu.
Dom Quixote foi escrito como entretenimento na época dos livros de ‘cavaleria’, uma sátira às fantasias, mas tornou-se clássico devido ao conteúdo, que atravessa os séculos.
Nosso gênio Machado foi e é um clássico. A segunda fase machadiana é de uma ironia ímpar, texto claro, de leitura rápida, que faz o leitor passear pela cultura da época, e que cultura!
Memórias Póstumas, p.ex., e o tal memorável emplasto, alterna períodos da vida do autor – coisa difícil de ser feita na escrita sem atrapalhar o leitor, ainda mais em primeira pessoa – de maneira simples e muito bem humorada. A abertura é hilária: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”.
Jorge Amado, na fase pós-panfletária comunista, mostrou seu talento e hoje é um clássico nacional.
Os clássicos contam o tempo, a cultura local, os costumes, o vocabulário da época, coisas que hoje não se encontram na literatura brasileira. Por outro lado, hoje, contar o quê? Talvez literatura criminal, corrupção nas altas esferas (e nem dá para criar muito suspense nesse assunto…).
De maneira geral, os grandes escritores são revelados sob regimes autoritários e perseguidores, como nos conta Zores Medvedev em seu livro sobre Soljenitsin e a perseguição comunista contra sua literatura realista – Um dia na vida de Ivan Denisovitch.
O escritor atual, brasileiro, tem contra sua obra a falta de educação formal dos nossos jovens. Por saírem semianalfabetos do primeiro grau, têm medo de ler e não entender o que estão lendo, por vergonha mesmo, assim, desistem antes de tentar. Quem vai se entreter com algo que não sabe o que é? E pior: 32% dos ‘pós-doutores’ que ensinam em nossas universidades são analfabetos funcionais. É… Ser escritor no Brasil é viver o dito: Em terra de surdos não se fabrica fone de ouvido.
Boa e triste essa versão moderna do clássico dito
Concordo com o Pedro.
Não se trata de tachar imutavelmente os clássicos como chatos e ininteligíveis, mas o hábito de ler é que traz o conhecimento necessário ao leitor para compreender tramas mais complexas.
Poucas são as escolas que tentam atrair as crianças com livros que falem a linguagem delas, em formatos de aprendizado atrativos. E aí os primeiros contatos com o livro se dão de forma traumática, através de livros “difíceis de entender”, “chatos”…
A literatura pode sim ser despretensiosa, assim como o teatro e cinema. Podemos simplesmente absorver o conteúdo de forma natural e, caso haja algo que nos faça pensar, aquilo plantará uma semente. Com o livro funciona da mesma forma. Você se envolve com a história e absorve aquilo de forma natural. Se você não entende o que está escrito, meu conselho é fechar e partir pra outro. Com o tempo, e com mais bagagem, um dia você estará pronto para tentar lê-lo novamente se quiser. Mas não adianta forçar, tem que ser um processo evolutivo. E, na minha opinião, a literatura de entretenimento ajuda nesse caminho.
É, Lorran, o caso foi que a minha escola me atraiu com bons clássicos. Talvez por isso seja difícil para mim entender por que nem sempre os clássicos funcionam. Aliás, sou da teoria de que a melhor época para ler os clássicos é até o final da adolescência, quando você tem mais tempo livre. Ter uma boa bagagem para então enfrentar os contemporâneos. O que não quer dizer ficar fechado só aos clássicos na escola, foi nela ue conheci também autores mais recentes, como Clarice.
“Aliás, sou da teoria de que a melhor época para ler os clássicos é até o final da adolescência, quando você tem mais tempo livre.”
Se eu tivesse lido José de Alencar nessa época, não estaria agora comentando neste blog de literatura. 😛
😉
Raquel, como alguns leitores já comentaram acima, também acho que as escolas deveriam iniciar os alunos em livros mais fáceis de ser ler lidos. Por exemplo, eu estudei em 2 colégios, um Waldorf e um mais tradicional. No Waldorf, a professora de literatura mandava os alunos lerem “O Senhor dos Anéis”, “O Dia do Curinga”, de Jostein Gaarder, “As Aventuras de Tom Sawyer”, de Mark Twain, “O Apanhador no Campo de Centeio”, de J.D. Salinger etc. Ou seja: livros de linguagem mais acessível do que os clássicos de língua portuguesa. Com isso, os alunos foram tomando o gosto pela leitura, e passaram a se interessar pelos grandes autores brasileiros e portugueses, que iam sendo introduzidos aos poucos nas aulas.
Já no meu colégio mais tradicional, o currículo de literatura era aquele básico: Machado de Assis, Eça de Queiroz, José de Alencar, Graciliano Ramos etc. Resultado: a grande maioria da classe não gosta de ler até hoje. E, para mim, isso ocorre pois tais livros não são leituras tão simples para um adolescente. Os jovens de hoje em dia (me senti muito velho escrevendo isso…) se atraem por ação, aventuras. Assim, um livro realista, como um Machado ou Eça, que descreve minuciosamente a sociedade, e cujas tramas giram em torno do dia-a-dia de pessoas, traições conjugais, dilemas pessoais e tal, não possui o ritmo a que eles estão acostumados, e pode parecer, à primeira vista, monótono. E se um adolescente não é acostumado com a leitura, isso o espanta, o deixa sem vontade de retornar aos livros.
Oi, Sergio, entendi o pontode vcs. Acho que minha resposta ao Lorran vale pra vc também. Lembro de contos tão mega engraçados e envolventes de Machado na escola que não consigo imaginar como isso poderia afastar alguém
Eça e Alencar são mesmo maçantes, mas Machado e Graciliano? Machado era o mestre da dinamicidade! Você se encanta com as descrições que ele faz, mesmo porque o foco dele é situar a personagem interagindo com o espaço – algo que o Eça tenta, mas não consegue. Mas você tem razão, deveríamos usar romances mais dinâmicos para os alunos. O problema é: onde encontrar romances assim na atual literatura brasileira (todos os exemplos que você deu são estrangeiros)? Ressalte-se o “atual” porque, se por um lado eu digo que há uma literatura de entretenimento em expansão no país, por outro sou obrigado a confessar que dificilmente eu recomendaria a algum adolescente sua leitura para fins didáticos. Que falta nos faz Marcos Rey…
Bruce e Raquel, concordo plenamente com vc – jamais poderia dizer que Machado, Graciliano, ou mesmo Eça e Alencar são maçantes. Porém, entendo que, para algumas pessoas, eles podem ser.
Quanto a ter usado exemplos estrangeiros, esse é outro problema para mim: por que só lemos livros de autores brasileiros e portugueses no colégio? Na minha opinião, deveríamos desvincular literatura de português, e estabelecê-la como uma matéria à parte. Assim, os alunos teriam que ler também Miguel de Cervantes, Flaubert, Goethe, Gabriel Garcia Marquez, S. Fitzgerald, Tolstoi etc (obviamente, com dificuldade progressiva, como falei acima). Acredito que, dessa forma, os alunos teriam uma visão muito mais ampla da literatura e do mundo em geral.
Sim, acho que poderia ser mais ampla, abranger mais países. No colégio a gente só aprende literatura brasileira, mesmo, ou pelo menos era assim no meu tempo. Agora, Eça é chato praca. Hahaha! Acho maçante, não teve um dele que eu tenha terminado sem sofrer. Acho que existem categorias e categorias de clássicos. Você pode fazer qualquer criança amar a leitura apenas apresentando crônicas feitas no início do século passado a elas, e isso será muito menos maçante que muita literatura dita de entretenimento por aí.
Meu professor de literatura fez a gente ler Romeu e Julieta em sala.
Mas tenho pleno conhecimento de que isso é exceção.
Acho que você fantasiou seus professores de literatura, isso não existe! Haha. Mentira, acredito =).
Hahahahhaha…o pior é que foi “O Primo Basílio” que me incentivou a ler os clássicos.
Mas vocês sabem como é o ensino de literatura em outros países? É como o nosso, ou seja, focado em livros da língua materna da nação, ou geral, abrangendo romances do mundo inteiro?
Não sei, mas sei que em história, por exemplo, somos muito mais abrangente que os europeus e os americanos, que só estudam o próprio umbigo. Imagino que todo mundo estude a literatura local antes de tudo…
(Inveja de você. Comecei a ler Primo Basílio por causa da série na Globo, achando que seria tão emocionante quanto, e não consegui ir em frente. Daí lia outros em casa e voltava a esse. E parava. E voltava. E parava. rs. A Cidade e as Serras já foi um caso de tortura imposto pela escola rs)
Nossa, Raquel, “A Cidade e as Serras” deve ser o mais leve dele.
Desculpe a inorância, não funcionou comigo =(
Seria interessante haver essa separação, mas o problema é que as escolas hoje visam a “decoreba” para o vestibular, não a educação para a vida. Parece piegas acreditar que elas deveriam propor o último, mas creio que só assim para gerar cidadãos conscientes e responsáveis.
Super apoio a leitura de Daniel Galera (“Mãos de cavalo” pra ter um pouco de ação, “Cordilheira” pra que as meninas não fiquem com a eterna ideia de personagens que só tem psicologia interna e são sensíveis mas nada fazem), Antonio Xerxenesky (“Areia nos dentes”, Faroeste+Zumbis!, “F para Welles”, que tem uma assassina profissional — único problema, só tem um trecho na Granta, por enquanto), Daniel Pellizzari (“O livro das cousas que acontecem” é tão divertido e fantástico e bom quanto muita coisa que importamos da Argentina), os livros da coleção “Ficção de Polpa” (ficção especulativa com muita gente escrevendo bem e poucos que decepcionam), Michel Laub (“O segundo tempo”, pelo menos, teria me deixado muito mais “tolerante” com o futebol se lido na adolescência, fora que deve atrair o povo que curte GreNais e etc., além dos que curtem um suspensezinho; “Fora da água”: adolescência e surf, algo que não sei se alguém mais escreveu; “Diário da queda” pra quem já tem um pouco mais de maturidade), João Paulo Cuenca (“O único final feliz” é divertido pacas, principalmente prum povo que nasceu vendo anime e power rangers).
E Pedro Bandeira é atemporal. Antes de Shakespeare, que foi meu passo definitivo na literatura mais “””””””séria”””””””” (lembro uma vez de ter resumido o plot de umas 15 peças do Billy Shakin’ para uma amiga, sempre parando num momento crítico pra ela ter vontade de ler, e não tem como negar: é massa demais), Pedro Bandeira me fez gostar MUITO mais de ler do que eu já gostava antes. E me deu vontade de ser escritor até, coisa que AINDA não virei. =P
Sorry, me empolguei de volta!
Se essa molecada da Companhia das Letras tivesse livro mais barato, eu lia, viu? 😀
(Em tempo, espero ler algo deles em breve. Só não pego a Granta com medo de me decepcionar e ficar tal qual “pré-adolescente-que-leu-Iracema-e-não-quer-mais-saber-de-literatura-embora-digam-que-o-livro-é-ótimo”).
Bruce, quase recusei essa mensagem. Favor não trazer G***** de volta a caixa de comentários! rs
(Calma, Raquel, não falarei o nome. Direi “Aquela que não deve ser nomeada”, rs).
Cara, se você morasse em Curitiba, eu te emprestava muito susse tudo que eu tenho deles.
Mas tudo que comprei foi com mega promoção. Já tinha lido tudo do Galera antes do Submarino fazer uma promoção arrebatadora estilo “autores brasileiros não vendem!” e eu comprar 2 livros pelo preço de 0,75. Xerxenesky e Cuenca eu comprei num sebo por 10 e 15 pilas, respectivamente, novíssimos! O livro do Laub e do Pellizzari eu comprei com desconto de livreiro e um monte de livros da Não Editora eu comprei numa promoção de 40% de desconto na Fnac. Mas realmente, tenho que convir, se for pelo preço base, muita coisa eu não conseguiria comprar. Muitas dicas escrevi aqui: http://oleitorcomum.blogspot.com.br/2012/01/ler-e-caro-compras.html
Uma coisa que curto em Curitiba, ainda que a mentalidade ainda seja tacanha EM MUITOS SENTIDOS (estilo burrocracia infinita para divulgação de coisas legais e telégrafos num mundo 3.0), é suas bibliotecas. Muita coisa muito legal eu li nelas. Todo o Daniel Galera, Michel Laub, por exemplo. http://oleitorcomum.blogspot.com.br/2012/01/ler-e-caro-bibliotecas.html
E as dicas se restringiram ao que acho que adolescentes leriam. E pelo seu “molecada”, creio que você não seja mais um.
(Sorry pela quantidade abusiva de links. Parece que só entro aqui pra fazer divulgação pessoal. Daqui a pouco a Raquel me bloqueia! rs =P)
Você vai entrar no spam, hahaha (mentira, mentira, vc é leitor de honra!)
E Naquela Que Não Deve Ser Nomeada há, pelo menos, uma ótima introdução à obra do Laub (dá pra ler numa sentada) e um aperitivo muito do bom do próximo romance do Galera, o mais grosso de todos: “câmera 2: isso você descobriu com exclusividade no Painel das Letras com a Raquel Cozer beijos *plim*” =P
Bacharelando em Letras, só falta apresentar o TCC. 😀
Ler não é questão de dinheiro ou de tempo. Ler é hábito. A partir do momento que criamos o hábito entramos em um mundo mágico. Aprendemos a garimpar livrarias e encontrar preciosidades que não estão em locais bem posicionados. Para criarmos o hábito, precisamos dar uma banana para o preconceito. Para ler um livro de “alta literatura” – sei lá o que significa – precisamos aprender a ler e, para isso, iniciamos com livros simples. Na minha adolescência aprendi a ler com os saudosos e apedrejados livros da coleção vaga-lume. E daí para os clássicos foi um pulo. Outro dia, uma sobrinha da geração facebook perguntou com cara de espanto o que era Dom Casmurro. Disse que era um livro que os professores mandam adolescentes lerem para nunca mais abrirem um livro. E é o que acontece. Nada contra ao maior gênio da literatura nacional, mas ensinar um adolescente do século XXI a com romace do século XIX é uma temeridade. Viva a subliteratura. Se mais pessoas lessem, existiriam menos farmácias no mundo.
Gente, mas Dom Casmurro é uma delícia de ler. Li na adolescência e fiquei fascinada. Ok, fui adolescente no final do século 20, não no início do 21, mas não creio que tenha mudado tanto de lá pra cá. Por falar em preconceito, não se pode criar o preconceito nas crianças só porque o livro é do século 19. Os da coleção Vaga-Lume também li antes, na infância (não me lembro de ninguém apedrejando eles, sempre foram elogiados como porta de entrada para a literatura, inclusive por professores), na mesma época em que lia Monteiro Lobato velho de guerra
Nossa, “Dom Casmurro” é incrível! Eu começaria com os contos para desenvolver o gosto, claro, mas te digo que te daria uma bronca, Pedro, por ter feito a menina fugir de uma obra que poderia amar. [:P]
É meio que um clichê usar o Machadão para falar que ele escreveu livros “que os professores mandam adolescentes lerem para nunca mais abrirem um livro”. Eu tento até entender, o nome é pomposo e dá um medinho mesmo quando você é criança, sei lá.
Mas usar Dom Casmurro como exemplo? Gente, eu já fiquei tanto tempo tentando entender a razão de usarem tanto esse livro como exemplo de livro que os adolescentes não curtem… Acho que é porque é o primeiro que vêm à cabeça, junto com o “Memórias póstumas”, porque não é possível… Li na adolescência e fiquei emocionado e, como a Raquel, fascinado. Gente, eu tinha ideias de “inovações literárias” na minha cabecinha juvenil e, quando vi, o Machado tinha feito isso há um século atrás!!! Pareceu-me que era um best-seller — ainda não tinha começado a ler livros que tinham essa denominação (e eu não a entendia muito bem, vamos combinar), mas aquilo claramente era algo muito legal e que todo mundo devia estar comprando e lendo ao mesmo tempo.
E cada leitura só cresce, cresce…
Desculpa, já tentei o máximo de transmodernidade, de alteridade, de exercício de olhar por meio dos olhos do outro, mas, bah, usar Dom Casmurro nesse sentido eu não entendo.
Eu sou burro no sentido “achar Dom Casmurro chato”, é isso. =P
***
É meio que um clichê usar o Machadão para falar que ele escreveu livros “que os professores mandam adolescentes lerem para nunca mais abrirem um livro”. Eu tento até entender, o nome é pomposo e dá um medinho mesmo quando você é criança, sei lá.
***
Mas usar Dom Casmurro como exemplo? Gente, eu já fiquei tanto tempo tentando entender a razão de usarem tanto esse livro como exemplo de livro que os adolescentes não curtem… Acho que é porque é o primeiro que vêm à cabeça, junto com o “Memórias póstumas”, porque não é possível… Li na adolescência e fiquei emocionado e, como a Raquel, fascinado. Gente, eu tinha ideias de “inovações literárias” na minha cabecinha juvenil e, quando vi, o Machado tinha feito isso há um século atrás!!! Pareceu-me que era um best-seller — ainda não tinha começado a ler livros que tinham essa denominação (e eu não a entendia muito bem, vamos combinar), mas aquilo claramente era algo muito legal e que todo mundo devia estar comprando e lendo ao mesmo tempo.
***
E cada leitura só cresce, cresce…
***
Desculpa, já tentei o máximo de transmodernidade, de alteridade, de exercício de olhar por meio dos olhos do outro, mas, bah, usar Dom Casmurro nesse sentido eu não entendo.
Eu sou burro no sentido “achar Dom Casmurro chato”, é isso. =P
Você dizer isso é especialmente interessante porque você não teve estímulos em casa para a leitura, né, Tuco. Então os clássicos podem sim funcionar. E Casmurro de Casmurro só tem o nome, mesmo. Acho que quem diz que é difícil na verdade nunca tentou ler…
“Acho que quem diz que é difícil na verdade nunca tentou ler…”
Mega verdade. Deu vontade de reler agora. =P
!
“dom casmurro” é possivelmente o melhor romance da literatura brasileira e um dos melhores literatura mundial.
mas pedir pra alguém de 14 anos, numa escola pública lá em sepetiba, às 14h, que tá com fome etc etc etc, não dá! ela não vai ler, vai ficar com raiva etc. isso se vc tiver a sorte dela prestar um mínimo de atenção no professor.
vamos combinar que a realidade brasileira não é uma das mais estimulante em vários sentidos. imagina então no que corresponde à leitura, quando esta hoje é uma prática no mínimo “estranha”.
Ah, mas por esse critério, qualquer coisa que você peça ao estudante da escola pública lá de Sepetiba com fome vai parecer chata… Acho que o problema é muito mais do professor, e infelizmente esse é um problema comum, enfim, de o professor não saber estimular o estudante a ler o que quer que seja. Meu argumento é: dom Casmurro é uma leitura fácil. É uma obra elaboradíssima, com várias camadas de entendimento (tanto que só fui entender realmente ao reler com 20 e poucos anos), mas, ainda que se perca algo da sutileza na primeira leitura, é uma leitura gostosa, fluente, que prende já no primeiro parágrafo. Não vejo, sinceramente, por que Dan Brown prenderia mais que Dom Casmurro.
Não quis falar mal do livro Dom Casmurro. Li na adolescência e em outras fases da vida. Só quis dizer – e talvez não soube expressar – que a leitura não deve ser algo imposto. Pergunte a uma adolescente se ela gostaria de ler uma Thalita Rebouças ou um Machado de Assis? A grande maioria leria os livros da Thalita porque se identifica mais. Porém, fale para um professor indicar Dom Casmurro e um livro da Thalita para ver o que acontece – vc será massacrado. Tenho uma colega que gostava de ler livros do Syndei Sheldon e da Agatha Cristhie (não conferi para ver se é assim que escreve, mas com certeza está errado) o pai dela proibiu falando que aquilo não valia nada e era uma porcaria. Resultado. Ela não criou o hábito de ler e vive vendo novelas. Se o pai dela tivesse deixado ela ler sem preconceito, talvez ela lesse os clássicos hoje. Se quisermos criar leitores de qualidade, devemos começar com a base e essa base passa necessariamente pelo Paulo Coelho, Thalita Rebouças, etc. Vim de uma família de leitores. Meu pai incentivava ler de tudo, sem preconceito. Lembro que adorava ler a coletânea Para gostar de ler com o Carlos Drumond de Andrade, Paulo Mendes Campos… Li diversos livros do Fernando Sabino. Uns mais de uma vez – O Grande Mentecapto li umas quatro vezes. Hoje sou um leitor voraz e leio principalmente os clássicos. Mas comecei pela base para chegar ao ápice. Quanto aos livros da coleção vaga-lume, lembro que vários professores deixaram de indicá-los falando que era coisa da ditadura para alienar as pessoas. Mas eram ótimos e nunca mais os vi.
Eles faziam um megasucesso. Acho que ainda existem, pela Ática, mas foram atropelados pelo mercado. Não conheço, entre quem gosta de ler, quem tenha vivido a infância nos anos 70 e 80 que não tenha lido vários da coleção. O Para Gostar de Ler também abriu muitas portas. E é altíssima literatura, digamos assim, separada em pequenos grupos de preciosidades para fisgar leitores. Agora, alguém comentou uma coisa e faz sentido: muita gente nunca sai do entretenimento porque, não tendo sido apresentado aos clássicos na escola, tem preconceito em relação a eles. Por isso acho importante apresentar. A literatura de entretenimento vem mais naturalmente, na base do boca a boca, então acho que faz sentido as escolas levarem os clássicos para a vida das crianças.
Acho esse debate fundamental hoje. Não cheguei a ver a mesa do Frazen pq estava a caminho de Paraty, mas que bom que ele se propõe a colocar o assunto em pauta. Conheço muita gente boa que acha que literatura é um texto que rompa com a estrutura conhecida e praticamente reinvente a língua. O problema é que longe de surgirem novos Guimarães Rosa, saem umas coisas impenetráveis que só por Deus.
Balzac, Flaubert e Machado de Assis não tinham medo de serem “best-sellers”, então, acho que quem quiser entrar nessa, não precisa temer estar em má-companhia.
Sim, sim. Ao mesmo tempo, que delícia ler textos “impenetráveis” vez por outra, não? Digo, textos que te obrigam a pensar o tempo todo, ou, melhor, até o momento em que de repente você entra na “chave” da narrativa e daí tudo começa a fluir. Acho o argumento do João Cezar muito válido, não é simples definir o que é o prazer da leitura.
Não acho ruim que resenha não seja ponto determinante na venda dos livros. Afinal, já falamos algumas vezes sobre esses críticos literários com níveis mto elevados e q esquecem da literatura de entretenimento muitas vezes menos intelectual.
Me incomoda mais o fato de que os livreiros tendem a deixar melhor posicionados os livros que vendem mais e das editoras que pagam mais pelo espaço. Aí vira um ciclo infinito dos mesmos best-sellers, dos mesmos autores, das mesmas gdes editoras etc etc etc.
E é engraçado o tabu em torno do fato de que as editoras pagam por espaço. Nenhuma livraria fala sobre isso –ou talvez só a Fnac admita isso abertamente…
A Não Editora, pequena, conseguiu espaço fazendo edições bonitonas, daquela que toda livraria quer expor em destaque. Daí não precisaram pagar espaço. Eles sempre usam esse exemplo da Cultura em reportagens (já vi umas 2 vezes).
Ou seja, tem como fugir do esquema. Eu acho a editora muito interessante por isso.
Mas isso é assim mesmo, esse jogo não pode ser aberto porque isso deixa mal os participantes. Por exemplo, num outro campo artístico, nem rádios nem gravadoras jamais assumiram o jabá – o pagamento pela execução de N músicas X vezes por dia num período Y, o que pode transformar uma gravação medíocre num grande sucesso.
Mas livro é um produto cultural e econômico ao mesmo tempo, né? Difícil saber como lidar. Pessoalmente, acho uma droga imaginar que o “mérito” de um livro bem exposto é o pagamento, mas daí você vê livreiros quebrando mundo afora e pensa se esse não é um direito deles para manter algum lucro… Sei lá. Mesmo.
Como leitor tanto da “alta” quanto da “baixa” – não resisti, rs -, digo que é bem possível que isso seja, afinal, questão de gosto. Seria interessante se os leitores hoje pudessem saltar ou alternar entre esses tipos de literatura da mesma forma como pulam da Globo pro SBT na hora do comercial. Vide que hoje consideramos Dickens alta literatura, mas seus textos tinham a finalidade de entreter – aliás, ele prestava atenção à opinião dos fãs de vez em quando. Agora, sobre o Franzen… Eu sou daqueles que diz que ele não é lá “essa Coca-Cola toda”, rs. Às vezes acho que ele é um Brian Moore mais prolixo, o que não é ruim, mas a sensação é de que não é algo surpreendente afinal. Sou obrigado a dizer que até Stephen King e John Grisham tem mais valor literário que ele. (E que comece o apedrejamento). 😀
Olha, Bruce, tb não achei Liberdade tdo isso, até escrevi no blog. Mas me disseram TANTO que eu preciso ler As Correções que resolvi parar de opinar até fazer isso. Agora, ele está falando exatamente de Dickens, de literatura como a dele, ao falar de uma literatura que saiba suspender e que seja pertinente, eu diria.
Eu curti Liberdade (as pessoas até linkaram o seu blog pra me cutucar dizendo “A Raquel achou um novelão”e eu respondi algo como “eu meio que achei isso também: qual parte de ‘curti pacas o livro e achei suas discussões interessantes’ você não pegou?”), mas tenho que começar o quanto antes “As correções”, pelas mesmas razões.
Bruce, leu “As correções”?
Esse mesmo. É legalzinho, nada extraordinário. Ainda não entendi porque esse hype todo. A escrita dele lembra muito Updike. Prefiro o amigo/inimigo dele, o Chabon. Não é lá muito original, mas pelo menos te prende a atenção.
Xi, não diz pro Tuca que Chabon não é nada lá muito original rs
Ok. pensei que você era meu amigo. Agora não quero mais conversa com você, humpf.
=P
A questão originalidade nele é horrível de discutir, até porque o Chabon adora dar uma boa misturada de estilo e inventar umas coisinhas. Digamos que eu já entrei na fase de repetir a bendita frase-feita do “não é sobre O QUE se escreve, mas sobre o COMO se escreve”. E acho que ele é bonzão no que faz. Em “As incríveis aventuras de Kavalier e Clay” usou um montão de clichês pra contextualizar historicamente algo que nunca existiu e fez um belíssimo trabalho. Em “Garotos incríveis” usou uma experiência pessoal desastrosa para criar personagens muito bons e, melhor que isso, legais de se ler (algo sempre temerário em livros que falam muito sobre o meio literário: ficar chatérrimo). Em “Associação judaica de polícia”, pow, fez uma espécie de 007 judeu, inventando tanta coisa absurda mas verossímil e com todo um “levar às últimas consequências”, coisa que eu admiro pacas (pensou em gírias, contextualização, um longo “E se…?”), que não tem como não… admirar (dane-se a repetição de verbo, hahahaha) — e olha que esse eu não AMEI tanto como os dois anteriores e o “Usina de sonhos”, que é mais fininho, menos ambicioso, mas mesmo assim emocionante a tal ponto de eu perceber que ele tava se encaminhando para o lado de Michael Cunningham entre meus autores contemporâneos favoritos. Até mesmo o último dele lançado aqui, que me decepcionou no sentido “mais um livro do Chabon”, é bem legal no sentido “o que aconteceu com Sherlock”. Mais sobre isso aqui http://oleitorcomum.blogspot.com.br/2011/11/nao-precisa-ser-sherlock.html
Desculpa se pareceu que eu tô brigando. Não tô. Só me empolgo com o assunto. É outra forma de dizer “tô nem aí pro ‘não é lá muito original’, mas concordo plenamente com o ‘te prende a atenção'” =P
Abraços aos dois!
Valeu pela resposta, Tertuliano, mas o caso é que eu foco mesmo “te prende a atenção”. Todos esses romances dele são ótimos porque as “firulas” estéticas que ele emprega funcionam, embora não sejam mais nenhuma novidade. Contudo, não acho que ele esteja querendo trazer algo novo, apenas fazer o romance funcionar. Eu diria que posso contar nos dedos das mãos o número de autores vivos cujo estilo, sempre que empregado, deixa você sem fôlego. O bom de tudo é que o Chabon é bom no que ele faz sem soar pedante, já o Franzen parece querer criar um manifesto estilístico nos romances que lança. Ele tem algo do tipo, não é?
Acho que é mais da crítica, mas, sim, o Franzen tem culpa nisso.
Gosto também dos ensaios dele, no entanto. Curte?
Ainda não li os ensaios. Vou ver se dou uma lida, nem que seja rápida. Sou da teoria de que alguns autores só revelam sua vida interior plena por meio de ensaios.
Liberdade é um livro tedioso!
Li até o fim por causa deste comentário todo sobre o Fanzen. Não sei se vou ler As correções… e se for chato tb?
Eu não sou fã de Liberdade, mas dizer que achei tedioso, no meu caso, não seria verdade. Digo, eu li aquelas… 600 páginas, é isso?… enfim, li aquilo tudo em dois dias, acho que tem um mérito aí.
O livro é bom sim, não sei se pra causar todo este barulho. E a “chatice” do livro se deve a parte do diario que é realmente tediosa, porem depois a historia ganha folego.
Nos dias de hoje, a maneira mais simples de reter a atenção das pessoas é ter como enredo monstros dotados de sentimentos humanos, lobisomens, extraterrestres, vampiros, bruxos, etc…
Teremos que nos contentar com romances sem profundidade, enredos fantasiosos, sem crítica social e voltados para o público infantojuvenil?
O intuito primordial da escrita era o de registrar os acontecimentos, sem regras, sem respeitar gramática os normas. Voltaremos ao início como descreveu George Orwell em “1984?
Ah, Rafael, mas a sugestão do Franzen, e a literatura dele, trata justamente de “suspender” as pessoas e ser pertinente ao mesmo tempo. Ele diz que não é o caso de escrever como James Patterson, mas toma o cuidado de não “atrapalhar” demais
considerando-se o entendimento comum que “dom quixote” foi o primeiro romance, onde que o gênero surgiu como entretenimento? a não ser que “entretenimento” tenha um sentido específico em inglês que não esteja presente noutras línguas |P
pelo que acompanho de soslaio dessa discussão, os argumentos contrários ao fp sempre me parecem melhores.
mas a “literatura de entretenimento”, por outro lado, é imprescindível. principalmente, nas escolas. o que não acontece, devido ao preconceito e conservadorismo que se inicia na universidade. porém, ao menos na minha turma de licenciatura em literatura, essa oposição já parecia ceder, visto a obviedade da crise do ensino da disciplina. se é uma linha de pensamento que se generaliza e se terá força para suplantar a compreensão defasada que impera nas escolas e nas universidades…
livro não é artigo de necessidade imediata de consumo. vende-se com o tempo. como ex-livreiro (de pequenas livrarias, ok.), livro exposto é pra leitor de vitrine, que varia conforme a livraria, localização, tamanho etc. resenha no jornal, porém, realmente sempre ajuda. mas a maioria que lê o suplemento literário, presume-se, pertence à turma de sempre (a galera “invisível”, segundo certos escritores. ahaha), que imagino estar mais ligada ao “00”, embora também deva adquirir os seus exemplares de “sub”.
creio que a graça maior talvez seja esta: a questão parece estar mais presente na parte que produz literatura (e seus adjacentes) que no próprio leitor, que compra ambos.
Nossa, mas Cervantes super era entretenimento, Thiago, assim como Dumas e Dickens. Tem que pensar no contexto em que surgiu, né, numa época sem cinema e sem literatura propriamente de massa (embora Dickens devesse vender naquela época mais do que a “alta literatura” vende hoje no Brasil).
Sobre literatura de entretenimento ser ensinada nas escolas, fiquei na dúvida. De qual você fala? Na minha escola só ensinaram os clássicos…
Mas os “clássicos” foram entretenimento de outros tempos.
Sim, sim, mas no nosso tempo eles já configuravam clássicos, né? Não era como se a escola não estivesse escolhendo direito. É inteligente pegar um bom clássico de entretenimento, por assim dizer, para estimular a leitura. Quer dizer, não sei, falo de “nosso tempo”, mas não sei que idade vc tem, vai que vc é do tempo em que clássico era contemporâneo 😉
[:P] pro seu comentário na última linha. O que eu quero dizer é, como alguém gostava de ler José de Alencar? E era entretenimento, antes de virar clássico. Curioso isso. Vide que os romances de Stevenson também eram para entreter, mas viraram clássicos após os críticos avaliarem sua importância para a literatura escocesa/de língua inglesa.
Ah, mas daí tem a evolução da literatura, digamos assim, não no sentido de evolução para melhor, mas com o tempo mesmo. Assim como acontece na música erudita, que vai mudando de estilo conforme os séculos. Tem uma história famosa no jornalismo cultural, do Ivan Finotti, repórter que um dia enviou para várias editoras, como se fosse um livro dele, textos menos conhecidos do Machado. Algumas responderam dizendo que não interessava. Depois, confrontado com o fato de que era um Machado, um editor disse: mas um autor que emula Machado na escrita no final do século 20 não estaria entre os melhores que podemos publicar, porque é uma escrita datada.
Convenhamos que se julgamento de editor fosse sinônimo de qualidade, Dan Brown continuaria pobre. 😀
Tebdo lido Dan Brown, posso dizer: tem razão, Bruce. Mas não me venha falar mal de Harry Potter 😉
Era o meu segundo alvo. 😀
Leia e depois comentamos humpf
oi, raquel!
mas um livro te entreter não significa que ele tenha sido escrito com essa finalidade, não? “dom quixote” surgiu no mínimo como crítica às novelas de cavalaria. ninguém acabaria por inaugurar um gênero novo (mesmo que não fosse a intenção) pensando somente em entreter, concorda?
aproveitando a deixa, pode-se citar o benjamin, da nova edição velha da brasiliense: o romance surge, do indivíduo isolado incapaz de experimentar e compartilhar, a fim de dar o sentido da vida. daí o lukács ter afirmado antes que o tempo é um elemento constituinte do gênero e, posteriormente a todos, o kundera dizer que tem coisas que só um romance pode dizer (ou algo do tipo). etc.
sobre a escola, me refiro a crepúsculos e harry potters. josé de alencar não era entretenimento! acontece que passou a se tratar muitos dos romances do século XIX como “inocentes” e clássicos por serem velhos eheh. mas pra obrigar aos alunos lerem “a moreninha” (aí sim), é melhor passar a saga crepúsculo. basicamente nenhum aluno vai criar gosto pela leitura lendo romances do século xix ou mesmo vários do xx. ao menos, penso assim.
machado de assis datado? datada foi a pessoa que disse isso. machado de assis sempre será muito mais moderno do que muita gente contemporânea que escreve “pau” e “porra” em seus romances.
Acho Machado de Assis genial, mas a última pessoa que tentou emulá-lo na escrita, Chico Buarque (em livro do qual aliás gostei muito), foi acusado de recorrer a um estilo datado. Dizer que é datado não é diminuir o mérito. Se surgisse alguém criando obras como as de Mozart hoje seria acusado de datado e com razão. Se alguém quiser emular Tolstói, idem. Isso não tira o mérito que a obra teve e ainda tem.
Sobre entretenimento, tinha entendido errado, achei que vc disse que as escolas ensinavam isso!
Se “entretenimento” em alguma medida medida quer dizer “diversão”, D. Quixote é o melhor livro de entretenimento que já li.
Dom Quixote é uma delícia, mas acho que o que mais me espantou nesse sentido, tipo o primeiro clássico que li, foi Os Três Mosqueteiros. Que, sim, foram criados como literatura para as massas 😉
Chamar “Os Três Mosqueteiros” de “clássico” já é um erro. Aquilo nunca passou de entretenimento. “Clássicos” são Balzac, Hugo, Proust. Jamais Dumas.
É uma clássica literatura de entretenimento, Jean, não seja ranzinza! Eu mesma comentei que a obra surgiu como literatura para as massas. Até um rock dos anos 80 pode ser definido como um clássico se for importante.
De certo modo o Balzac e o Hugo podem ser considerados “entretenimento”, certo? Eles escreviam pra massa e recebiam por letra/palavra. Dois vendidos! 😀
Bom, você usa o conceito de “clássico” de uma forma não-crítica, mas apenas coloquial. Estamos falando de coisas diferentes aqui. “Clássico” para você significa uma coisa, para mim, bem outra. Clássico é um conceito antípoda a entretenimento: é nesse sentido que uso o conceito. Também o conceito de “massa” é problemático, pois a “massa” da época de Balzac era muito diferente do que hoje é considerado “massa”.
Clássico antípoda de entretenimento? Jesus! Shakespeare então não é clássico? Pobre Sonho de uma Noite de Verão…
“Antípoda”? E só me avisam agora? Me envergonho agora em perceber que me entreti lendo “Édipo Rei”. Que farei agora da vida, são Bloom? Que farão agora os cidadãos que assistiam as peças de Ésquilo e que experimentavam catarse? Ou os trovadores que passeavam por Lisboa? Ó doce melancolia de vós, autores de outrora, como puderam deixar este incauto ser vítima dos prazeres ao ler Shakespeare, Racine, Goethe, Mann, Camus, Dan Brown? (Não forcemos mais que a divagação pode ir longe.) 😀
Bom, vou parar por aqui. Não consigo me fazer entender, é inútil. Vocês me confundem com um dogmático apenas porque vocês próprios são relativistas culturais. E eu não sou nem uma coisa nem outra. Mas estou cansado de tanto tentar explicar minha posição e ser mal interpretado aqui (certamente é culpa minha: devo ser pouco claro). Abraços a ambos.
Shakespeare é clássico e jamais foi entretenimento. Mas é inútil discutir isso. Estamos chamando coisas diferentes de “clássico” e de “entretenimento” aqui. Vocês dois estão usando esses conceitos de uma forma muito diferente da que eu uso. Para mim “clássico” significa “de excelente qualidade artística” e “entretenimento” significa “de qualidade artística medíocre, duvidosa ou má”. Por isso, Shakespeare é clássico e Dan Brown é mero entretenimento. O meu critério é o valor artístico da obra em si mesma e não o tipo de reação do público em relação a ela ou a suposta intenção do autor.
Tudo o que Shakespeare foi em seu tempo foi entretenimento, e os maiores estudiosos de Shakespeare dirão isso. Mas tudo bem, é só um uso que você faz dos termos. Essa regra que você criou é estritamente pessoal, então você não precisa desmerecer quem tem visão diferente.
“O Globo” era praticamente “a Globo” da Inglaterra elizabetana, Jean. Ou seja, se houve queda de qualidade, a culpa não se deve ao “entretenimento” em si, mas à incapacidade dos autores que se seguiram de chegar a esse mesmo nível. Infelizmente nem todo mundo consegue alcançar o “sublime”, a “catarse”, etc. Às vezes, nem mesmo os “clássicos”.
Bem, Raquel, eu discordo de você de que a regra seja uma mera invenção da minha cabeça: basta uma simples olhada no dicionário para ver que as palavras “clássico” e “entretenimento” podem ser usadas também no sentido em que as uso (e não fui eu quem inventou a língua portuguesa). No mais, não estou “desmerecendo” a sua posição, mas apenas discordando dela. Eu penso que para uma análise atual de uma obra de arte o conceito de entretenimento seria mil vezes mais frutífero se não fosse usado de forma genérica (como você faz), mas de uma forma mais restrita, mas específica. Usando o conceito de entretenimento de forma geral, não conseguimos distinguir nada e podemos colocar Shakespeare e Sidnei Sheldon no mesmo pacote. É apenas isso que me desagrada. Para mim esses dois autores são opostos e não tem nada em comum quando se trata de valor literário. Agora, se quisermos dizer que “entretenimento” é qualquer obra que causa prazer em certo público alvo, bom, nesse caso, toda arte é entretenimento. Mas já referi por que não gosto desse uso: ele tende a embotar nosso senso crítico em relação ao valor artístico das obras.
O que eu disse que você inventou foi que a ideia de clássico necessariamente exclui a ideia de entretenimento. Isso não está no dicionário, e essa discussão toda começou com você dizendo que minha forma de usar o termo “já é um erro” (e não que você simplesmente pensava diferente, o que seria natural). E você repete que acha o uso que eu faço “genérico”, como se houvesse regra para isso. Mas, enfim, como falei, é só a sua visão. A forma “correta” não é necessariamente como você, pessoalmente, acha correta e que eu, pessoalmente, acho restrita. Enfim, acho que nós dois já esclarecemos nossos pontos de vista, certo? Essa discussão está começando a ficar circular demais para o meu gosto (no uso que eu faço da expressão “discussão circular”, é claro =P).
Jean, da forma como você define “clássico”, até parece que uma obra assim já nasce pronta. Tipo, você acha que Ian McEwan ou Philip Roth escrevem romances pensando “ah, esse vai ser um clássico”? Ou que tal ideia passou pela cabeça de Shakespeare, algo do tipo “que ‘Rei Lear’ seja uma obra que ninguém curta ler no futuro, mas que nasça um clássico”? As chances de isso acontecer são as mesmas de um dia pegarmos num livro de Sidney Sheldon e dizer, “puxa, esse livro do Sheldon é um clássico”. Ninguém pede que os autores escrevam algo que perdure – se perdurar, melhor ainda -, mas que escrevam bem e se entreguem da melhor maneira possível a essa arte.
Suas definições subjetivas de “clássico” e “entretenimento” são o que mais me deixam com a pulga atrás da orelha. Por exemplo, conheço quem se “entretenha” lendo “A Vênus das Peles”. Eu não consigo, afinal, não sou o público-alvo. Mas considero o livro um “clássico”. E aí, como faz?
Eu não inventei idéia nenhuma, cara Raquel, aí que você se engana. Qualquer pessoa sabe que um clássico é um clássico (uma obra de primeira qualidade) e que entretenimento é entretenimento (obras de caráter fácil e ligeiro, obras produzidas por aquilo que Adorno chamou de indústria cultural, por exemplo). Nesse sentido é obvio que os dois termos são opostos. Quando eu disse que a sua posição era “um erro” eu estava me referindo apenas que era um erro a partir desse ponto de vista (que não é apenas meu) e não um erro em absoluto. Não se trata de duas opiniões pessoais aqui (a sua e a minha): trata-se de duas leituras diferentes dos conceitos de clássico e de entretenimento, apenas isso. Reduzir a minha posição a um capricho da minha cabeça não é justo nem correto. Ninguém é uma ilha: mesmo que não percebamos, estamos sempre defendendo alguma linha pública e tradicional de pensamento. Por mim, a discussão está encerrada. Lamento se irritei você.
“Uma obra de primeira qualidade” é algo bem subjetivo, Jean. Por esse seu critério, Kubrick é o quê? Um diretor de obras de primeira qualidade ou um diretor de cinema, essa arte da indústria cultural? A questão é que você quer impor o que você pensa como regra (“qualquer pessoa sabe” não é uma expressão muito boa para quem diz que faz um uso analítico e rigoroso dos conceitos), enquanto eu estou só tentando mostrar que o que eu penso não diminui o que você pensa e vice-versa. Mas concordo com você que essa discussão já acabou faz tempo. Obrigada pela participação.
Raquel, eu nunca quis “impor” nada. Não sou um dogmático tolo. Eu apenas discordo totalmente de você sobre isso de uma obra de primeira qualidade ser algo “subjetivo”. É exatamente o oposto. Não importa se alguém ama Dan Brown e odeia Shakespeare, por exemplo: o primeiro é sempre um clássico (arte de primeiro nível) e o segundo sempre entretenimento (obra para distração fácil), independentemente de gostos subjetivos. Kubrick é cinema artístico de primeiro nível, logo, clássico. Quando eu usei a expressão “qualquer pessoa”, na verdade eu queria dizer “qualquer pessoa culta”, mas não quis usar o adjetivo porque estava temendo o mal entendido que a palavra poderia causar. Bom, pelo visto, houve mal entendido de qualquer forma…
Mas estamos apenas perdendo tempo aqui. Um diálogo de surdos, na verdade. Eu não consigo me fazer entender. Você e o Bruce avaliam muito mal a minha posição, vocês me atribuem coisas que eu nunca disse e intenções que nunca tive.
Bem, é o suficiente. Desculpe a polêmica inútil. É impossível ser claro o suficiente num espaço como este.
Um abraço.
Qualquer pessoa que pensa diferente de você é inculta, Jean. Imagine você que tem gente que acha a obra de Clint Eastwood arte de primeiro nível e tem gente que acha uma bobagem estereotipada sem fim. Não é subjetivo? Eu particularmente acho estereotipado, mas o Inácio Araújo, crítico dos que mais admiro, defende que é o que se produz de melhor no cinema nas últimas décadas, arte em seu estado mais nobre. Você não precisa pegar exemplos extremos para tentar explicar, tente pensar que a coisa é um pouco mais sutil. Não existe uma definição rígida do que é “arte de primeiro nível”.
E outra: pelo seu novo argumento, então um rock poderia ser clássico, sim. Um “Like a Rolling Stone”, uma música contemporânea analisada quase unanimemente pela crítica como arte de primeiro nível, uma música que permite uma infinidade de camadas de leituras, seria um clássico. Isso eu falei lá atrás, que para algumas pessoas um rock pode ser considerado um clássico. A não ser que, pelo seu critério, arte de primeiro nível só chegue até o jazz. Ou até o erudito.
“Qualquer pessoa que pensa diferente de mim é inculta”! Eis aí porque eu não queria usar esse adjetivo! Eu sabia que você me interpretaria assim. Por favor não me atribua posições que eu não defendo de forma alguma, minha cara Raquel. Eu nunca disse nada disso. Não tenho preconceitos culturais. Eu já disse que gosto de cultura de massa (entretenimento) e a consumo. Eu sou fã de Indiana Jones e Star Wars, por exemplo. A questão é a seguinte. Há vários níveis de arte. Para ficarmos no exemplo da música: há Beethoven, há Duke Ellington, há Elvis e há Restart. Eu diria que clássico é Beethoven e que Restart é entretenimento. Duke Ellington está mais perto de Beethoven – mas não é um clássico -; Elvis está mais perto do Restart – mas não é entretenimento. O que eu quero dizer é: o termo “clássico” só deveria ser usado para as realizações máximas da arte (Beethoven, Shakespeare, Bergman, Picasso, Pessoa, etc.) e o termo “entretenimento” apenas para as realizações mínimas (Dan Brown, Sidnei Sheldon, Tiririca, Restart, novelas da globo etc.). É claro que entre esses dois níveis há todo um mundo multiforme (o jazz, um filme como Amadeus ou os do Sergio Leone, os livros do Humberto Eco, etc., etc.). São obras intermediárias que não são clássicos (em geral, ainda que sejam ‘clássicos’ em seu gênero específico, mas é exatamente contra esse uso do termo que eu argumento) nem entretenimento (porque são obviamente trabalhos que vão além da distração fácil e gratuita). Os filmes do Eastwood estão nesse meio termo. Eu estou consciente de que esse é um uso purista do termo “clássico”, mas é a linha que defendo e acredito ter bons argumentos para isso (argumentos que não posso desenvolver aqui, na pressa). Penso que a vulgarização do termo “clássico” mais atrapalha que ajuda. Quero dizer: se contarmos com os gostos pessoais para definir o que é um clássico, então qualquer coisa pode ser um clássico, tudo poderá ser clássico, esse é o problema (é isso que eu chamo de fazer um uso geral do termo: você pode aplicá-lo a qualquer obra, dependendo de quem fala, pois os gostos são subjetivos e jamais haverá acordo quanto a isso). Por isso defendo que o uso do termo tenha por critério unicamente o máximo valor artístico das obras. Ou você acha que qualquer pessoa razoável vai negar que artistas máximos da humanidade (Homero, Petrarca, Balzac, Machado de Assis) possam ser consideradas clássicos da literatura, por exemplo? Se uma pessoa nega a excelência de autores como esses, então eu nada tenho a dizer a ela.
Deusdocéu, você tinha prometido que ia parar! Argh. Parabéns pela sua tabela de valores artísticos. “Máximo valor artístico como critério único”: acabou-se o mundo.
Obs: Os Três Mosqueteiros sai dentro da coleção Clássicos da Zahar, editora respeitabilíssima, como você deve saber. Uma boa definição de clássico: obra reconhecida como importante para a história da cultura, independentemente do valor artístico. Não digo que seja essa A definição certa, porque A definição certa não existe. É só uma outra definição, além dessa que você defende e além de várias outras possíveis.
E pare. Sério. Argh! Socorro. Vou chamar a polícia! Mentira, não vou, mas meu deus.
“Robinson Crusoe” foi escrito como “arte para distração fácil”. E aí, como faz? 😀
Por que eu tenho que parar? Você quer ter a última palavra, é isso? Vou continuar enquanto eu julgar que fui mal compreendido. Posso?
O que uma editora diz sobre o que é ou o que não é clássico, isso tem alguma importância? UMA editora é critério para a história da arte agora? Eu concordo contigo: não existe A definição certa para o valor de uma obra de arte. Eu não pretendo que a minha seja isso. Não existe A verdade. Existem verdades melhor argumentadas e apenas isso. Mas nunca se trata de verdades subjetivas. São verdades de linhas de pensamento. São verdades publicamente compartilhadas e endossadas. Verdades de melhores estudiosos dos temas em questão. Como eu já disse, trata-se de defender linhas de pensamento, e não de defender a Verdade sobre qualquer assunto. Só um dogmático tolo crê nisso e eu não sou dogmático. Eu sei que a “minha” é só mais uma posição. Mas ” “minha” b não significa aqui “exclusivamente minha”, mas “concordante com certa linha de crítica literária”, que várias outras pessoas defendem ou defenderam. A sua definição de clássico é boa, mas é muito mais ampla que a aquela defendo. O problema dela é que é dependente demais do conceito de cultura. Conceito mais geral e mais ambíguo que este não existe. Ah, sim, Raquel: tenha calma 🙂 Ou você não suporta posições contrárias a sua?
Deusdocéu, você tinha prometido que ia parar! Argh. Parabéns pela sua tabela de valores artísticos. “Máximo valor artístico como critério único”: acabou-se o mundo.
Obs: Os Três Mosqueteiros sai dentro da coleção Clássicos da Zahar, editora respeitabilíssima, como você deve saber. Uma boa definição de clássico: obra reconhecida como importante para a história da cultura, independentemente do valor artístico. Não digo que seja essa A definição certa, porque A definição certa não existe. É só uma outra definição, além dessa que você defende e além de várias outras possíveis.
E pare. Sério. Argh! Socorro. Vou chamar a polícia! Mentira, não vou, mas meu deus.
Haha, Jean, por favor, entenda a piada. Falei isso porque você disse que ia parar e continuou respondendo e respondendo. A questão é que você quer que as definições alheias sejam menores que a sua, e eu, ainda bem, não tenho essa ambição. De todo modo, você colou minha resposta abaixo da sua, o que me deixa com a última palavra. =P
Bruce, eu já disse que o “meu critério” NÃO É a intenção do autor. O autor pode ter a intenção que quiser isso não importa. Quem vai julgar se uma obra é ou não um clássico é o tempo, ou seja, o trabalho filtrado da crítica especializada ao longo do tempo. Eu posso escrever uma obra apenas com o intuito de divertir e daqui há duzentos anos elas ser considerada um clássico, ou vice-versa: posso querer escrever um clássico e não conseguir fazer mais do que uma obra banal. A minha intenção não importa. O que importa é o julgamento público que a minha obra terá. “Beowulf”? Você se refere ao filme “Beowulf”? No qual a Angelina Jolie tem um papel? Eu adoro esse filme, já vi duas vezes. Mas é apenas entretenimento, of course.
Raquel, eu estou no meio de uma festa neste momento, então estou cometendo alguns erros básicos aqui. Foi por isso que inclui a sua mensagem junto, foi um lapso. Em relação a sua frase “A questão é que você quer que as definições alheias sejam menores que a sua”, é o que eu já disse: não pretendo ser dono da Verdade. Apenas defendo certa posição e não desmereço as posições diferentes da minha. Você defende uma posição que é muito diferente da minha. Então cada qual tem seus argumentos. Você acha que seus argumentos são melhores que os meus, e eu acho que os meus são melhores que os seus. Natural. As discussões tem como pressuposto que os debatedores realmente acreditem em suas próprias posições. Eu defendo a minha com unhas e dentes. Seria isso um isso é um defeito?
“Quem vai julgar se uma obra é ou não um clássico é o tempo, ou seja, o trabalho filtrado da crítica especializada ao longo do tempo.”
Mas é isso que a gente tá dizendo, criatura! Só que estamos indo além: o público é quem estabelece se isso é clássico ou não. Como? Mantendo tal obra sempre em discussão. A crítica vai demonstrar porque ela acredita que aquele texto apresenta características interessantes e que o tornaram atemporal, enfim. Por isso que podemos chamar tanto “Os Três Mosqueteiros” como “Iracema” de clássicos: são obras que ou ainda continuam sendo debatidos ou trouxeram algo de novo para a literatura ou foram destaque de algum período marcante da literatura/história de um país/povo. Você pode ter um ataque com o que eu vou dizer, mas Umberto Eco é apaixonado pelos livros da série 007 escritos por Ian Fleming e por quadrinhos. Você pode achar que a qualidade deles é questionável, mas de tanto serem analisados e lidos – importa que a obra seja sempre revista -, eles foram alçados a categoria de clássicos em seus gêneros. E olha que o que eu li do Fleming me deixou pasmo com relação a estilo de escrita e furos no enredo. São parecidos com “Beowulf” – que não, Jean, não é o filme. “Beowulf” é um poema extenso em língua inglesa arcaica que tem influências das sagas escandinavas. É considerado um “clássico” por ser um dos primeiros textos de língua inglesa que sobreviveram até hoje e por ter feito parte da tradição oral dos bretões antes das invasões normandas. Eu mesmo não curti o filme porque no roteiro há um fator freudiano com o qual não fui com a cara, mas isso é minha opinião. “Beowulf” para mim é um mito heroico, não uma reflexão sobre o complexo de Édipo.
Mas Jean, de quem você pega esses critérios afinal? Só gostaria que você me respondesse isso. Fico com Aristóteles nessa de estabelecer o que é um “clássico”. Quando escreveu “Poética”, só falou de três trágicos clássicos (Ésquilo, Eurípides e Sófocles) porque foram os únicos cujas obras sobreviveram – e eram populares e foram exemplo máximo para a criação de uma norma estilística para a tragédia.
Bruce, eu não estou “culpando” ninguém. Eu nada tenho contra o entretenimento ou a cultura de massa, eu próprio sou um consumidor dela. Eu sou estudante de filosofia e tenho por hábito ser rigoroso com o uso dos conceitos. É por isso não concordo quando certos conceitos são usados de forma muito geral, porque isso apenas confunde a cabeça das pessoas. Eu prefiro usar os conceitos de uma forma mais analítica e rigorosa. Apenas isso. Um gosto pessoal por certa linha de análise.
Ah, mas aí você cai na armadilha rohdeniana (distinguir “crear” de “criar” – se bem que o próprio Rohden menciona isso em todo livro dele), e você não pode simplesmente esperar que pensemos igual a você ou que vejamos tudo do seu ponto-de-vista. Só que “clássico” em literatura não é definição pronta porque texto algum nasce um “clássico”. Aliás, as chances de uma obra entrar para a história por ter seu valor reconhecido são ínfimas. É preciso que elas apresentam um diferencial real, um Sublime incrível, uma Catarse excepcional, uma mudança radical de Estilo, etc. Portanto, interpretações subjetivas de certos substantivos não podem fazer frente a definições amplamente reconhecidas e aceitas pelo público. Sinto muito, mas você poderia ter poupado toda essa discussão deixando claro o que é “clássico” na sua opinião.
Bruce, a “minha” opinião nunca esteve em jogo aqui. Eu recuso todo e qualquer subjetivismo como impossível. Eu não sou relativista nem dogmático. Mas deixa para lá. Você não vai entender o que estou tentando dizer, de qualquer forma. É perda de tempo.
Me desculpe, mas eu gostaria de saber de onde você tirou que “clássico” equivale a “uma obra de primeira qualidade”. Se for assim, eu mesmo desconsideraria “Beowulf” um clássico pelos furos enormes que tem em termos de enredo. Mas por que é um clássico? Porque é um dos textos mais antigos de língua inglesa. Você desconsideraria tal qualidade (em termos de característica) inerente à obra só porque ela não está bem escrita de acordo com os parâmetros que você diz usar? Aliás, que parâmetros são esses?
Aliás, Raquel, quero te parabenizar pelo seu espírito democrático. Primeiro porque é raríssimo uma blogueira (ou um blogueiro) dar tanta atenção aos seus leitores como você o faz (pelo que vi, você responde a todos!). Segundo porque, dada a nossa discussão, qualquer outra(o) blogueira(o) já teria me cortado (você tem esse poder), mas você não fez isso comigo. Pelos dois aspectos, você me surpreende e está de parabéns. Uma aula de democracia: é o que você exemplifica.
Haha, eu não cortaria você, Jean. Só corto quando a pessoa parte para a baixaria ou agressão pessoal, o que aconteceu uma ou duas vezes, mas numa discussão como essa, quando discordo mesmo, só fico aqui que nem criança, batendo o pé =P. Mas também aceito argumentos alheios, acredite. Por isso acho importante dar espaço e resposta sempre. Fique à vontade para voltar e comentar. Quem sabe numa próxima a gente concorda (ou discorda e continua numa discussão infinita). 😉
“A questão é que livreiros tendem a deixar mais bem posicionados nas lojas os títulos assim que aparecem na imprensa. Na semana seguinte, muda tudo de novo.”
O texto que escrevi recentemente pro Rascunho parte justamente daí. =P Depois que publicarem mando o link, pra você comprovar.
Eu acredito, mas me mande o link que linko aqui 😉
Bah, nem tem muito a ver. É uma resenha do livro “Ao anoitecer”, de Michael Cunningham. Só que eu nunca começo o texto do nada. Daí para falar da capa, falei da competição visual toda que há nas livrarias, hahaha.
Mas, enfim, passo o link de qualquer forma. ^^
É bom que esse debate esteja chegando ao Brasil. O ideal é que seja despido de #mimimis futuros, discutido com seriedade.
É cedíssimo pra se falar numa indústria nacional de entretenimento (e issotambém tarda demais a acontecer), no entanto é algo que deve estar no horizonte de editores. Só que os autores também precisam trabalhar para serem escritores bons e cada vez melhores, pois isso daria solidez à toda a ideia da consolidação da literatura de entretenimento no Brasil.
A Geração Subzero, coletânea da qual faço parte, é um passo em direção a isso. Um primeiro passo. E primeiros passos nunca são os definitivos, mas são sempre os mais importantes em qualquer caminhada.
Não mencionei no post, mas quem sempre diz que falta potencial de entretenimento na literatura feita no Brasil é a Luciana Villas-Boas