A saga problemática do Prêmio Jabuti
21/09/12 15:49Não queria voltar ao assunto problemas do Prêmio Jabuti neste ano. Não queria porque, no ano passado, a coisa começou com um erro ostensivo na seleção de um título, o que levou à desclassificação do finalista em questão, e foi parar num critério muito questionável para a eliminação de outros títulos, numa espécie de caça às bruxas literárias.
A discussão sobre os critérios começou com a indicação de “As Horas de Katharina (Record), de Bruno Tolentino, título que não só não era inédito, como preveem as regras, como já tinha sido premiado no Jabuti de 1995 na mesma categoria. A diferença na nova edição era uma peça de teatro, mas a indicação foi em poesia. Tratei do assunto no blog, e o livro foi desclassificado.
Na sequência, desclassificaram também “Itinerário de uma Falsa Vanguarda” (34), de Antonio Arnoni Prado, e “Alceu Penna e As Garotas do Brasil: Moda e Imprensa” (Amarilys), de Gonçalo Júnior –ambas versões muito ampliadas das edições publicadas originalmente. O problema das novas versões, tão diferentes das originais, foi manter o título.
***
O problema é que a coisa já começou mais estranha neste ano. Uma demora no anúncio dos finalistas (a apuração, aberta ao público, algo elogiável, foi ontem; a lista final saiu hoje) fez com que chegassem a sair antes na internet listas incluindo títulos que acabaram desclassificados. Um deles foi “Ramayana” (Berlendis & Vertecchia), de Laura Bacellar e Carlos Fonseca. O diretor editorial Bruno Berlendis já se manifestou contra a decisão. Diz ele:
“O livro foi concebido, discutido e escrito com base em diversas traduções, adaptações e estudos críticos do grande épico indiano. (…) Qual não foi nossa surpresa ao sermos informados que, não obstante o resultado da votação, o livro não mereceria constar de tal lista, pois o Conselho Curador julgou que adaptações de obras literárias não devem pleitear o prêmio.
“Justificaram-no invocando o Regulamento do Prêmio Jabuti, onde consta que não serão aceitas obras que não sejam ‘integralmente inéditas’. Nisso incorreu-se, porém, em uma série de falácias. A definição de ‘ineditismo’ está contida no Item II, 2: ‘Consideram-se inéditas as obras que nunca foram publicadas, em edição formal, em formato impresso, às quais tenham sido atribuídos ISBN e ficha catalográfica.’.
‘No que tange a esse pré-requisito, o Ramayana de Laura Bacellar atende perfeitamente à definição de ineditismo. A obra jamais fora publicada anteriormente em qualquer formato, nem nessa redação, nem em redação semelhante. Desafio quem pensa que sim a comparar o livro ‘juvenil’ de Laura com o calhamaço em 24 mil versos escritos em sânscrito milênios atrás.”
***
No Twitter, a tradutora Denise Bottman já atentou para a estranha presença neste ano de “Grundisse” (Boitempo), de Karl Marx, entre os finalistas de tradução, que segundo o regulamento só considera “textos exclusivamente literários de ficção”. No ano passado, o “Outono da Idade Média” (Cosac Naify), de Huizinga, foi eliminado justo por não ser ficção.
O que argumentei no ano passado, e o que continuo achando, é que o problema do Prêmio Jabuti é ser inchado demais. Após o imbróglio com os livros de Chico Buarque e Edney Silvestre, em 2010, o prêmio anunciou mudanças para 2011 –mas, em vez de reduzir categorias, estipulou mais três. Neste ano criaram o conselho para evitar erros, o que foi uma boa iniciativa, mas, com tantos livros a serem avaliados em tantas categorias diferentes, não há curador (e o curador do Jabuti, José Luiz Goldfarb, é de um empenho admirável) que dê conta.
Dito isso, parabéns aos indicados e sorte a quem pleiteia mudanças.
***
Atualização em 26/9: hoje, sem nenhum anúncio, a CBL fez alterações na lista de finalistas do Jabuti. Um editor havia anotado resultados das categorias infantil, juvenil e ilustração de infantil e percebeu erros na contagem; esses erros, especificamente, foram corrigidos, assim como os de duas traduções. O “Ramayana”, não considerado inédito, continuou de fora.
O Jabuti deveria se chamar: JABÁ-ti… Puro lobby de cartas marcadas…
O publicitário Maurício Tagliari e o editor Rogério de Campos lançaram e divulgaram orgulhosamente por todos os meios de comunicação, que seu livro DICIONÁRIO DO VINHO Tagliari e Campos, é um projeto inédito e original no mundo.Esta informação consta inclusive da abertura do livro. Não é verdade. Participei do projeto e sei que é baseado no DIZIONARIO ENOLOGICO, de Giuseppe Sichieri e Michele Perinotti, EDITORE ULRICO HOELPI MILANO, 1999, do qual tenho uma xerox fornecida pelos próprios autores brasileiros.O original italiano está nos mesmos 6 idiomas desta versão brasileira.
Incomoda muito, e deve incomodar todos os profissionais sérios, tamanha falta de ética ser agora indicada ao Prêmio Jabuti.
Eu era sócia da Conrad, editora que desenvolveu o Dicionário do Vinho, e participei do projeto brasileiro desde o início.Todos os envolvidos tinham muito claro que o trabalho era baseado no original italiano, porém seria muito mais completo. Mas daí a vender como inédito e original no mundo existe uma distância incrível. Até pq é uma falta de respeito enorme com os profissionais do vinho e do livro no Brasil e no mundo. Os autores têm a arrogância de afirmar na introdução do livro, que entre milhares de publicações no planeta, não há nada similar. A afirmação já é pretensiosa por si só. Quanto mais tendo em vista o fato de o projeto ser baseado em obra já publicada que circulava abertamente na Conrad. Detalhes importantes demonstram a má fé e a falta de ética, principalmente o fato do DIZIONARIO ENOLOGICO original italiano não aparecer na bibliografia do livro brasileiro.E veja que estamos falando de um editor e um publicitário! É muito comprometedor. E triste indicar ou premiar esse tipo de “profissional”.
O crédito de livro usado como base consta no volume da Conrad, Cris?
Olá Raquel!
Não consta nenhuma referência ao livro italiano na ed brasileira.
É, deveria constar…
Oi Raquel! E já que não consta e que eles vendem a obra como inédita no planeta, o que vc acha que deveria acontecer se fossemos um país sério, de profissionais e jornalistas sérios e de Prêmios sérios???
Abaixo links do livro italiano
http://www.amazon.com/s/ref=nb_sb_noss/191-7252849-3121947?url=search-alias%3Daps&field-keywords=DIZIONARIO+ENOLOGICO%2C+de+Giuseppe+Sichieri+e+Michele+Perinotti%2C+EDITORE+ULRICO+HOELPI++MILANO
Antes de falar de qualquer coisa queria dizer que fiquei boquiaberta com a ilustração do Carlos Fonseca para o livro Ramayana! Lindíssima !
Quanto a premiação não acho que devo opinar muito pois não intendo dessas coisas rs. só acho que o livro não deveria ter sido desclassificado, a estória parece ser ótima, riquíssima… E uma adaptação não deixa de ser algo inédito, pois a estória não é só o “enredo” em si , mas como isso foi escrito, a riqueza da linguagem da escritora etc.
um pouco nada a ver com o tópico (pois é difícil comentar sobre o jabuti, não? se complicam mais a cada ano que passa), mas como estão bonitas as ilustrações do carlos fonseca!
Lindonas!
Jabuti está inchando demais e perdendo a credibilidade com tantas confusões. E tem muitas categorias, mas tem isso porque para inscrever um livro você paga por volta de mil reais e por isso tantas categorias. Desta forma o prêmio está deixando de ser uma referência de qualidade. O que é uma pena.
Sim, concordo com você. Por conta disso, qualquer outro prêmio menos inchado, como Telecom ou o Prêmio SP, dá mais status hoje…
Parece campeonato de futebol, sera que Renato Teixeira esta envolvido no premio Jabuti
contospoesiacia.blogspot.com.br/
Explicação muito boa sobre papo. bom trabalho.
Imbroglio com os livros de Chico e Edney? Que imbroglio? O Chico ganhou o Jabuti porque o livro dele é infinitamente superrior ao do Edney Silvestre.
O Imbroglio (se houve) foi criado por razões ideológicas por pessoas que não se conformaram com o resultado. Afirmavam que o Chico era petista e por isso foi premiado. Suprema ignorância.
Imbróglio houve, ora. Imbróglio envolve questionamentos, sejam eles motivados pelo que forem.
Por mais defeitos que tenha, esse critério privilegia a criatividade. É triste ler que autores preferem se prender a essa fraca definição de “ineditismo” do que soltar sua criatividade e criar algo novo.
Eliminar adaptações é discutível. Uma adaptação é bem diferente de uma cópia. Vide o livro vencedor (de forma merecida) do Jabuti 2008 na categoria livro didático, que foi a adaptação de “O Alienista” em quadrinhos feita pelos irmão Fábio Moon e Gabriel Bá.
O trabalho deles em cima do texto original exigiu uma recriação tal que pode ser considerado perfeitamente como uma obra inédita, o que creio ser o caso também do “Ramayana”.
O fato é que, a partir do momento em que o regulamento especifica seu critério de ineditismo, se algo não se enquadra ali, deve ser considerado como inédito. Portanto, pelos motivos apresentados, a desclassificação foi injusta (não li o livro, mas me baseio no que foi dito pelo blog).
Só de ter o privatar1a tuc4na já está ótimo!
Não li, não saberia avaliar. Quero ler o do Leonencio e acho o do Christian fora de série.
e seria muito trabalho dizer quais são os indicados (ou ao menos dar um link)?
Ops! Linkei os posts e esqueci de linkar justo esse. Faço isso assim que chegar num computador (to no cel)