Random House, Penguin, Companhia das Letras: o mercado editorial em mutação
29/10/12 20:37As “Big Six” –nome dado ao conjunto das seis maiores editoras do mundo, Simon & Schuster, HarperCollins, Random House, MacMillan, Penguin e Hachette– agora serão cinco. Foi a maior notícia do mercado editorial em muito tempo: a confirmação, hoje cedo, da joint venture entre a empresa alemã de mídia Bertelsmann, proprietária da Random House, e da editora britânica Pearson, que detém a Penguin.
A Penguin Random House deve começar a atuar no segundo semestre do ano que vem, respondendo, sozinha, por 27% do mercado editorial global. Terá com isso tamanho suficiente para se impor no mercado digital, no qual editoras vêm enfrentando dificuldades nas negociações com gigantes da tecnologia como Google, Apple e Amazon.
(Update para contextualização feita no Twitter: valor de mercado da Apple, US$ 567 bilhões; do Google, US$ 221 bilhões; da Amazon, US$ 108 bilhões; e da Random Penguin, US$ 3 bilhões)
Outras das “Big Six” já foram compradas anos atrás por empresas de mídia, caso da HarperCollins, pela News Corp, da Simon & Schuster, pela CBS, e da própria Random House, mas analistas acham provável que também estejam conversando entre elas para outras fusões do gênero –a HarperCollins mesmo andou falando com a Pearson depois que surgiram, na semana passada, as primeiras informações da fusão de hoje.
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Onde o Brasil entra nesta história? Bem, para começo de conversa, em email para os funcionários do grupo Penguin, o presidente John Makinson –que comandará o conselho da nova empresa– destacou que a Penguin Random House levará em conta todos os interesses das duas atuais editoras “nas línguas inglesa, espanhola e portuguesa”.
A Penguin já marca presença aqui desde a aquisição de 45% da Companhia das Letras, no ano passado. Tempos atrás, o grupo Bertelsmann inaugurou um escritório em São Paulo, e representantes da Random House andaram conversando com editores brasileiros para avaliar opções de compra. Não saberia dizer se a fusão com a Penguin interromperia essas conversas, considerando que a nova empresa já detém parte de uma editora no Brasil, ou se outras negociações continuam. Editores brasileiros com quem conversei creem que, após a situação se regularizar, a Penguin Random continuará com outras conversas.
É digno de nota, de todo modo, Makinson destacar a língua portuguesa entre os grandes interesses do novo grupo. E mudanças expressivas ocorridas no último ano na Companhia das Letras permitem desconfiar que resultados esses interesses trarão na prática.
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A Companhia das Letras resolveu anunciar também hoje alterações internas que parecem ter tudo a ver com a compra, em 2011, de parte da editora brasileira pela Penguin: a saída de duas veteranas na casa, a diretora editorial Maria Emília Bender e a editora Marta Garcia; e a reestruturação do departamento editorial, com o editor Otávio Marques da Costa assumindo a função de publisher do selo Companhia das Letras, e a editora Júlia Moritz Schwarcz a de publisher dos selos Companhia das Letrinhas, Boa Companhia, Claro Enigma e Seguinte.
Maria Emília, elogiada por todo mundo pelo talento para treinar novos editores, e Marta, editora de texto em que o mercado inteiro já deve estar de olho, saem –Maria em abril, Marta no final deste ano– por decisão própria, tomada semanas atrás, depois de mais de 20 anos na Companhia. O fato é que a estrutura da editora vem sofrendo transformações significativas, com os editores assumindo, além da edição de texto, um papel importante na parte de negócios.
Certamente não foi por acaso que, no começo deste mês, o editor Luiz Schwarcz destacou em post no Blog da Companhia justamente Maria Emília e Marta como formadoras de “uma escola de exímios editores de texto”, e Otávio e Júlia como representantes de uma nova geração, cujos aprendizados terão “efeitos sensíveis na estrutura e desempenho da editora no futuro”.
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Por ora, o efeito mais perceptível foi o investimento da Companhia das Letras em selos comerciais, caso da Paralela (que publicou o erótico “Toda Sua” na esteira do sucesso do “Cinquenta Tons”) e do juvenil Seguinte, e ainda do Boa Companhia, com grande potencial para venda em escolas. Ótimo para a editora, embora nada imprescindível para o leitor –vamos combinar que editoras de best-sellers comerciais não são algo que esteja em falta no Brasil.
A longo prazo, creio que veremos acontecer no Brasil situações como essa que testemunhei semanas atrás, quando Pedro Almeida, diretor editorial da Lafonte, comentou que tinha adquirido os direitos de “Release Me”, de J. Kenner, anunciado como a resposta da Random House ao “Cinquenta Tons”. Estranhei: mas o “Cinquenta Tons” não é da Random House? Ele explicou:
“Na verdade, o ‘Cinquenta Tons” é da Knopf, do selo Vintage, que pertence à holding alemã Random House, mas cada uma das empresas funciona de forma independente. A Knopf foi uma das agregadas ao grupo. A Random é a editora original, principal. A Bantam, que vai publicar ‘Release Me’, é uma editora americana da Random House, que adquiriu a Knopf. Não são concorrentes como seria uma Harper, mas são concorrentes entre si.”
Ficou claro?
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Por falar em ficar claro, aparentemente há algo muito engraçado na opção alternativa de nome Random Penguin (em vez da oficial, Penguin Random), algo além da ideia de um “pinguim qualquer” ou “aleatório” e que escapa à minha compreensão (digo, além da ideia da adjetivação ao pinguim), porque muita, muita gente lamentou no Twitter que o nome não fosse esse. Se alguém souber explicar, agradeço, porque já atormentei meio mundo com isso.
Se um gênio do departamento de marketing não aparecer com a sugestão de “Pinguim Randomizado”, já estará de bom tamanho. Aliás, considerando que “random” é sinônimo de “whatever” na gíria de muitos, o novo nome dará pano pra manga, né não, Raquel?
Tenho uma gata chamada Whatever, acho que a próxima vai se chamar Random
Raquel será que você pode me ajudar em algo? Gostaria de saber da Companhia das Letras se posso enviar meu livro pessoalmente? Meu manuscrito tem mais de 800 pág. Fica muito caro manda-lo pelo correio e eu não tenho esse dinheiro. Algumas editoras aceitam apenas pelo correio e acho que isso acaba excluindo alguns escritores, em especial aqueles que moram na mesma cidade onde se encontra a editora. Aqueles que não tem condições financeiras de arcar acabam prejudicados e perdem a oportunidade de ter sua estória avaliada. Obrigada.
Pelo que eles dizem no site, só pelo correio, mesmo http://www.companhiadasletras.com.br/contato.php. Considerando a quantidade de material que eles devem receber, eu arriscaria dizer que é difícil que abram exceção. Mas talvez seja o caso de vc ligar lá e perguntar. Boa sorte!
Eu mandei e-mail p eles e entrei no site algumas semanas atrás. Vou tentar por telefone… Obrigada Raquel…
Antunes, no comentário dele, tem uma dica pra vc
Deixa eu meter o bedelho aqui. Fernanda você não precisa enviar o livro inteiro, basta enviar três ou quatro capítulos. Se eles gostarem, vão entrar em contato com você, até pela curiosidade de ler o resto do material.
Opa, obrigada pela dica, Antunes!
Convenhamos, o mercado está cada vez mais mercenário, em “mercantilização”, isso sim. Ou seja, cada vez mais o livro é visto como mera mercadoria e menos como produto de cultura, a ponto de muitos editores serem mais homens de negócio do que E DI TO RES no sentido lato e mais humanístico dessa palavra. Daqui a pouco, veremos qualquer businessman editando Shakespeare e jogando fora achando pouco comercial… Vivam as editoras pequenas e independentes!
Elas são importantes. E no Brasil têm feito um bom trabalho na seleção de títulos que as grandes deixam escapar
vale lembrar que foi pela bertelsmann (círculo do livro, na antiga sociedade com a c.p.c., aka, richard civita, que tinha como braço editorial a nova cultural) que se iniciaram os descalabros de plágios de tradução, com o espantoso “enrico corvisieri” inaugurando as baixarias do grupo: http://naogostodeplagio.blogspot.com.br/2008/11/assassinado-tradutores-23.html#
Interessante, não conhecia a ligação da Bertelsmann no Círculo do Livro…
Tudo fica muito claro, claríssimo. É o capitalismo cruel com suas garras afiadas e a boca salivando de fome para comer as pequenas. É um darwinismo social. Exemplo? a indústria cervejeira no Brasil e de refrigerantes no mundo. Os pequenos editores? ora, nem políticas de cotas terão. Morrerão sem direito a eças e círios ardendo. Missa de corpo presente e réquiem cantado? nem pensar.
Já existia um meme com pinguins antes, ó:
http://knowyourmeme.com/memes/socially-awkward-penguin
Pode ser a fusão desses memes com esse novo pinguim aleatório.
Siiim, um amigo, o Fê Brito, levantou essa hipótese, mas parece que tem uma gíria cockney com o nome “random penguin”. Atualização em minutos! 😉
Alan, o expert em língua inglesa, diz que nada tem a ver com pinguim aleatório, mas sim com o fato nada aleatório de que o primeiro nome é de quem manda na fusão, o que quer dizer que a Penguin é que vai mandar nos rumos do grupo. (?)
Até faria sentido, mas, pelas piadas de ontem, não é isso não. Parece que é uma gíria de mano inglês. Em minutos, a resposta aqui 😉
Só vc mesmo, Raquel, pra investigar tão bem esse mundo dos editoriais….. parabéns
😉
isso mesmo, pedro! puxa, é um trabalho importantíssimo este o teu e vc o faz muito bem, raquel. gracias!
Ué, Raq, não é porque desse jeito fica um substantivo adjetivado que resulta em “pinguim aleatório” ou “pinguim sem rumo”? muito mais engraçado do que “penguim random”, que não quer dizer nada…
Sim, sim, no começo pensei isso, um “pinguim qualquer”, como falei no post, mas é assim tão engraçado para durar o dia inteiro no Twitter? rs. A princípio o post se chamava “a casa dos pinguins aleaórios”, mas comecei a achar que não podia ser só isso. Levantei várias possibilidades, inclusive “random” como “sem sentido” e “penguin” como alguém estranho (embora “sem rumo” não tenha me ocorrido, o que fica engraçado para uma editora) mas nada me pareceu tão risível assim. Aparentemente é uma remissão a um meme que não chegou ao Brasil, porque até Tumblr com esse nome tem!