Hilda Hilst: 'Não quero ser lida como distração'
17/05/13 18:14Achei que tinha perdido o prazo, mas não. Ainda dá tempo de assistir ao monólogo “Jozú, o Encantador de Ratos”, com Carla Tausz, na Casa do Sol, onde Hilda Hilst morou e onde hoje fica o instituto que leva seu nome, em Campinas. Este é o último final de semana.
A montagem circulou bastante e foi premiada antes de inaugurar o teatro de arena da casa, instalado num terraço interno. Foi essa a versão que eu vi, um mês atrás. E só digo uma coisa: quando todas as luzes do cenário apagam e a Lua ilumina o palco-terraço… Caramba. É de arrepiar. Quem quiser aproveitar estes últimos dias tem de torcer para não chover. Dá para ver também quando chove, mas eles transferem a montagem para dentro da casa.
A programação do teatro está sendo fechada para os próximos meses, com textos de Hilda ou gente ligada a ela. De 5 a 9 de junho, a Carla Tausz, atriz do “Jozú”, dirige Glauce Guima no monólogo “O Cordeiro da Casa”, baseado em contos de Mora Fuentes (um deles é este aqui, curtinho). A partir de 17 de agosto, tem “A Obscena Senhora D”, com Suzan Damasceno sob direção de Rosi Campos e Donizetti Mazonas, hoje em cartaz no Teatro Eva Herz, em São Paulo.
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A reportagem sobre Hilda Hilst para a Ilustrada no mês passado deve ter sido a pauta mais encantada que já fiz. Nunca demorou tanto. Desde a ideia, em agosto do ano passado, data das fotos de Karime Xavier que ilustram este post, até a publicação foram oito meses.
Isso por uma conjunção de fatores, sendo os principais deles a espera pelo livro de entrevistas “Fico Besta Quando me Entendem” (Globo), que saiu por estes dias, lindíssimo, organizado por Cristiano Diniz, e pela estreia do teatro na Casa do Sol.
Acabou que, na semana em que pudemos publicar a reportagem, estávamos também com um material sobre os 90 anos da Lygia Fagundes Telles, de quem Hilda foi amiga por toda a vida.
As taurinas nasceram com dois dias (e sete anos) de diferença, mas não poderiam ser mais diferentes, na estilo e na escrita, o que deu uma graça à solução encontrada: uma capa unindo ambas. O texto sobre Lygia foi do Paulo Werneck, editor da “Ilustríssima”.
Sobrou muita história, quem sabe para posts futuros. Por ora, seguem frases do livro de entrevistas. E, já que Clarice teve direito à sua verve artística por aqui, encerro com um dos rabiscos de Hilda que ilustram a bela edição da editora Globo.
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“Quero ser lida em profundidade e não como distração, porque não leio os outros para me distrair mas para compreender, para me comunicar. Não quero ser distraída. Penso que é a última coisa que se devia pedir a um escritor: novelinhas para ler no bonde, no carro, no avião.” (1975)
“Como eu vejo e sinto um ser político? Como de repente você pode ficar cristalizado dentro de sistemas, sejam eles quais forem? Como é que as pessoas são levadas a aderir a partidos, esquemões, todas essas estruturas rígidas e senescentes como o marxismo, o fascismo, o capitalismo, o fanatismo religioso?” (1981)
“As pessoas têm pânico em falar naturalmente de sexo. O que é que vocês imaginam que falam um homem e uma mulher na cama? Ele não vai falar aquela frase que eu sempre repito: ‘Deixa-me oscular a sua rósea orquídea’ [risos]. Então, se existe um texto que se usa na cama, onde se usam as palavras abaixo da cintura com seu nome normal, por que esse medo horroroso?” (1991)
“A única coisa que eu pude fazer na vida foi escrever, porque é a única coisa que eu sei fazer mesmo. Dizem que eu sou megalômana. Sou. Meu texto de ficção é deslumbrante, é da pessoa ficar gozando o tempo todo.” (1998)
“Fui, junto com Mario Schenberg, dar uma aula inaugural na Unicamp. […] A certa altura, um físico meio gargalhante, que estava coçando o saco, perguntou: “Quer dizer então que a senhora acredita mesmo na imortalidade da alma?”. Respondi: “Acredito na imortalidade da minha alma. Mas o senhor, se continuar coçando o saco dessa forma, sequer constituirá uma alma!” (2001)
“- Como é ser poeta no Brasil de hoje?
– É uma merda.” (2003)